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Ruth Ramos Sabat (UFRGS)
Como as normas heterossexuais são construídas nos filmes infantis de animação? Quais os mecanismos utilizados nas narrativas fílmicas para reproduzir a heterossexualidade como norma social? Como o outro é representado no processo de produção de identidades de gênero e sexuais normalizantes?
Tais perguntas servirão como balizas para este artigo, pois considero-as produtivas na medida em que nos permitem pensar como alguns artefatos culturais, tais como os filmes infantis de animação, estão constituindo a infância, considerando que freqüentemente, as crianças assistem a esses filmes inúmeras vezes – seja em casa, no cinema ou na própria escola – decorando as músicas, os gestos, os diálogos.
É dentro desse contexto que se produz um currículo cultural que constitui sujeitos, ensina comportamentos, hábitos e atitudes. E é a partir desse contexto que escrevo este artigo: tomando o filme Mulan, como um artefato cultural que opera como meio de representação do eu e do outro, como forma de educar e governar sujeitos, como um meio de regular condutas. Tal representação não traz apenas marcas concretas, mas também subjetivas, envolvendo ética, sentimentos, qualidades pessoais. Ao analisar as representações do feminino, é imprescindível observar também de que formas o feio, o estranho, o abjeto é representado, considerando a indefinível fronteira entre esses elementos e seus opostos, ou seja, o belo, o “normal”, qualidades freqüentemente atribuídas aos heróis ou às heroínas.
Nesse sentido, meu objetivo é analisar de que formas a conduta heterossexual está sendo re/produzida nos filmes infantis de animação, na medida em que eles tornam possível educar e regular os sujeitos (Donald, 1999). Busco observar de que forma os filmes infantis de animação constróem representações de gênero e de sexualidade, a partir do outro como parâmetro de normalidade. Portanto, ao analisar as representações do feminino, estarei também analisando as representações do outro no filme Mulan, como o outro da heroína, do feminino. Para isso tomo como suporte o conceito de performatividade (Culler, 1999; Butler, 1999); e de representação (Silva, 1999). Utilizo tais conceitos – inseridos na teoria queer e na perspectiva dos Estudos Culturais, respectivamente – para analisar a construção da heterossexualidade como norma social.
No filme Mulan, dos estúdios Disney (1999), o pai de Mulan, a heroína, é convocado a se alistar no exército que vai lutar contra os Hunos. Como seu pai está velho e doente, Mulan disfarça-se de homem e vai para a batalha com o objetivo de preservar a honra da família. Nessa narrativa, o outro com o qual a personagem tem que se defrontar, se apresenta de duas formas: por um lado através dos Hunos, seus inimigos; por outro lado, através de seus próprios companheiros homens do exército.
Inicialmente, mostro a importância que tem a visualidade na cultura ocidental, localizando o cinema e os filmes como artefatos culturais que utilizam mecanismos educativos e até mesmo pedagógicos. Em seguida, apresento alguns dos tópicos fundamentais da teoria queer, utilizando especificamente os argumentos da filósofa americana Judith Butler (1999), relacionados à performatividade. Na parte final do artigo, apresento uma análise do filme Mulan, utilizando a teoria performativa como ferramenta analítica.

I – O cinema como cultura visual
A cultura é produzida, entre outras coisas, pela visão; ao mesmo tempo o ato de ver alguma coisa é já, ele mesmo, produtor de cultura. A experiência visual no mundo contemporâneo tem caminhado muito próxima da construção do real; de um real que nem sempre é racional, como no caso da presença constante de monstros e bruxas nas histórias infantis. São os novos problemas identificados no ato de ver que estão no centro de uma perspectiva pós-moderna. Isso não significa minimizar a importância da textualidade, mas sim ampliá-la ou torná-la elemento importante na cultura visual. A imagem, e tudo o mais relacionado à visão, constitui também o texto escrito sobre o social, sobre sujeitos históricos.
Isso não significa, de modo algum, assumir a centralidade da visão, mas sim problematizá-la considerando sua relação com outros sentidos e com outras formas de representação. O visual, as imagens, são muito mais que estratégias ou recursos para enriquecer o texto escrito. Mirzoeff (1998) afirma que “[o visual] oferece uma proximidade dos sentidos que não pode ser rivalizada pela mídia impressa: ele é o próprio elemento que torna a visualidade de todos os tipos diferente dos textos”. (p.9). Essa sensação imediata que irrompe no momento em que observamos um evento suscita sentimentos como raiva, admiração, prazer, horror. Ou seja, podemos identificar o cinema como um dos mecanismos mais importantes na produção de uma cultura visual e que funciona, basicamente, por meio de um processo de interação com o público espectador suscitando os mais diferentes tipos de reações.
Até a primeira metade deste século, o sucesso alcançado pelos filmes de longa-metragem era devido exclusivamente aos seus próprios méritos, ao contrário de hoje, quando os longas são apresentados acompanhados de diferentes artigos produzidos para serem consumidos simultaneamente e contribuindo diretamente para o sucesso do filme. No caso dos filmes infantis de animação os artigos vão desde camisetas, sapatos, jogos eletrônicos, até grande número de artigos escolares como cadernos, lancheiras, mochilas.
Atualmente, o filme é apenas um dos produtos que compõem um agregado de produtos formando um pacote multimídia de consumo cultural que funciona dentro da lógica capitalista do mundo globalizado. Desse modo, os custos da produção podem ser garantidos não apenas pela bilheteria do cinema, mas sim por uma ampla estratégia publicitária e de marketing. Uma das conseqüências é que o processo de significação é ampliado envolvendo outros espaços além da sala de cinema. Um exemplo interessante foi o que ocorreu com o filme Os caça-fantasmas (Ghostbusters) do qual o logotipo foi divulgado muito antes do seu lançamento, através de camisetas, bonés e até mesmo da trilha sonora; o filme entrou aí apenas como mais um dos produtos a serem vendidos (Turner, 1997). Mais recentemente, com o lançamento do filme Tigrão, os estúdios Disney em parceria com a mega rede de sanduíches McDonald´s comercializou 2 milhões de personagens do filme em forma de bonecos para atender a demanda. Segundo Turner (1997), ultimamente muitos orçamentos de produção de filmes têm sido menores do que a verba destinada para sua publicidade.
Os desenhos animados, no formato de filmes infantis, têm sido produzidos em números cada vez maiores, pelos grandes estúdios cinematográficos. Longe de serem simples mecanismos de diversão, tais filmes podem ser considerados artefatos que exercem uma determinada pedagogia cultural. É a partir desta perspectiva que busco analisá-los como espaços de constituição de identidades de gênero e sexuais, e como construtores de uma heterossexualidade normativa que produz sujeitos da educação. Freqüentemente, os filmes infantis produzidos constróem as diferenças de gênero e sexuais de forma “convencional”, determinando a construção hierárquica do feminino e do masculino como definitivas e imutáveis.
Tais filmes são dirigidos mais específicamente a uma faixa etária determinada e neles o que podemos observar é uma série de narrativas em torno de comportamentos e valores que, entre outras coisas, estão produzindo determinados sujeitos de gênero. É nesse sentido que se torna importante estarmos atentas/os para as formas através das quais as representações de gênero têm sido reafirmadas na sociedade ocidental contemporânea, contribuindo para educar sujeitos e normalizar condutas.

II - Atos que constituem o sujeito
Se a visualidade ocupa um lugar de destaque na cultura contemporânea, o mesmo podemos dizer da linguagem como elemento imprescindível no processo de representação cultural. Considero, pois, produtivo pensar em termos de possíveis cruzamentos entre a noção de representação e de ato performativo; e, a partir daí, analisar como essas duas noções operam para produzir o outro.
As noções de representação e de ato performativo surgem ambas no contexto da “virada lingüística”. Representar aqui é nomear a realidade e ao mesmo tempo constituí-la, a partir de significados que são atribuídos a eventos, a objetos, a sentimentos. Assim sendo, o ato mesmo de representar significa constituir realidades através da linguagem. Tudo o que é nomeado é feito a partir de um contexto em que tal nomeação faça sentido e, desse modo, nomear/representar, torna-se imediatamente algo material. (Silva, 1999).
Quanto à performatividade, este é um conceito que se apoia na teoria dos atos de fala de John Austin (1990), uma expressão performativa realiza algo, no momento de seu proferimento, desde que dita nas circunstâncias apropriadas. Judith Butler (apud Culler, 1999), propõe considerar o gênero como performativo, pelo fato de ele não ser uma afirmação ou uma negação, mas sim uma construção que se dá através da repetição de atos que tenham alguma correspondência com as normas sociais e culturais. Portanto, um gênero é um modo de subjetivação dos sujeitos, pois do mesmo modo, "o 'eu' nem precede nem se segue ao processo de atribuição de gênero, mas surge apenas no interior de e como matriz das próprias relações de gênero" (Butler apud Culler, 1999, p.103).
O gênero dos sujeitos, portanto, é constituído em meio a esta operação, e como tal ele precisa ser constantemente reinvocado. O que não se pode esquecer é que esse processo implica reafirmar atribuições específicas aos indivíduos e, ao mesmo tempo, subverter tais atribuições. Ou seja, o gênero e o "eu" dos sujeitos são constituídos não pelo que são em uma condição preexistente, mas sim pela forma como são nomeados em diferentes momentos de sua existência. Culler (idem, p. 103) apresenta o seguinte exemplo:

Desse ponto de vista, a elocução 'É uma menina!' ou 'É um menino!' pela qual um bebê é, tradicionalmente, saudado quando vem ao mundo, é menos uma elocução constativa (verdadeira ou falsa de acordo com a situação) do que a primeira de uma longa série de performativas que criam o sujeito cuja chegada anunciam.


O questionamento da heterossexualidade como sexualidade normativa tem encontrado na teoria queer seu espaço mais forte de debates. Na teoria feminista a palavra “queer” remete de imediato a questões sobre homossexualidade e o que se conhece hoje como teoria queer tem sido afirmada como área de estudos desde 1991. Seu surgimento ocorre a partir da união dos estudos gays com os estudos lésbicos, estes reconhecidos como campos disciplinares desde a década de 80, quando emergem dos estudos feministas. A teoria queer vem radicalizar a idéia de que também a sexualidade é uma construção social. Segundo Deborah Britzman (idem, p. 74):

Nenhuma identidade sexual —mesmo a mais normativa— é automática, autêntica, facilmente assumida; nenhuma identidade sexual existe sem negociação ou construção. Não existe, de um lado, uma identidade heterossexual lá fora, pronta, acabada, esperando para ser assumida e, de outro, uma identidade homossexual instável, que deve se virar sozinha. [Grifos da autora].

A concepção da heterossexualidade como apenas mais uma das sexualidades construídas socialmente, é o ponto de partida da teorização queer; isso significa dizer, por outro lado, que a homossexualidade, a bissexualidade – e as várias outras formas através das quais os sujeitos vivem seus desejos – também são problematizadas pela teoria queer. Ao fim e ao cabo, o que está em jogo nesta perspectiva teórica é o questionamento de qualquer tipo de rotulação de identidades sexuais ou de gênero, sob pena de fixar algo que não deve – ou não pode – ser fixado.
Os códigos de heterossexualidade, envolvem negociar e compartilhar significados nas próprias relações sociais. Compreender a identidade heterossexual como re/produzindo-se permanentemente, significa aceitar que a heterossexualidade não é prazerosa e tranqüila sempre. A impossibilidade de pôr em xeque algumas normas e signos, está ligada ao caráter supostamente natural da heterossexualidade que prescinde de um questionamento de si própria como problemática. É precisamente em meio a esses discursos que são produzidas representações hegemônicas de heterossexualidade como a sexualidade “normal”.
De maneira mais ampla, é em torno dos argumentos acima que se desenvolvem as discussões sobre gênero e sexualidade, a maioria compartilhando da separação no que diz respeito a sexo (homem ou mulher), a gênero (masculino ou feminino) e à sexualidade (homo ou heterossexual).
Desestabilizando esse quadro que, em alguns momentos, parece ser estável ou tranqüilo Judith Butler, uma das principais teóricas queer, vai pensar a identidade, o corpo e o sujeito desde um mesmo eixo analítico: em termos de uma teoria performativa. Butler (1999), argumenta que o sexo, assim como o gênero, é materializado através de práticas discursivas, de normas regulatórias que não são nunca finalizadas, pois permanecem num processo constante de reafirmação. Tal processo é indispensável para garantir a hegemonia das leis regulatórias, sob pena de fragilizar e abrir espaços para contestação de tais leis. Nesse sentido, a utilização do termo queer para nomear esse campo de estudos, funciona como uma estratégia política de reafirmação de um significado na forma contrária como tem sido utilizado habitualmente.

III – Atos que subvertem o sujeito
No filme Mulan observamos a permanente reiteração performativa em função da construção de sua suposta masculinidade como um modo de salvar a honra da família. Tal necessidade afirma-se desde o início, quando em meio a uma discussão entre os ancestrais sobre uma forma de salvar Mulan, que foi se alistar no exército disfarçada de homem, um deles diz: sua bisneta tinha que ser transformista!. Declara-se, então, a mudança de um gênero para outro; uma transformação que precisa de alguns artifícios para se concretizar.
Mulan, então, passa por um processo de construção de uma nova identidade. Ao ser rejeitada como candidata a noiva, ela canta: quem é que está aqui junto a mim/ em meu ser/ é a minha imagem/ eu não sei dizer/ vou desvendar quem sou/ eu vou lembrar/ quando a imagem de quem sou/ se revelar. Essa busca de Mulan anuncia sua transformação subjetiva, no momento em que percebe que não se sairá bem como esposa perfeita; transformação esta que mais tarde deverá ter marcas corporais e de atitudes, quando ela assume um "comportamento" masculino. A construção da personagem representa a oscilação permanente entre qualidades consideradas femininas e outras consideradas masculinas, através de um sucessivo número de nomeações.
O dragão Mushu (um ser enviado pelos ancestrais para proteger Mulan) ensina-a como agir: é o seguinte: tem que andar que nem homem, levanta o queixo, ombro pra trás, separa os pés, ergue a cabeça... Ao avistar um grupo de soldados, um mexendo nos pés, outro com o dedo no nariz, ela diz isso é uma nojeira!, e o dragão responde: não, são homens e você vai ter que ser igual a eles. Em outro momento, enquanto toma banho no lago, Mulan (agora chamada Ping) justifica-se: Só porque pareço com um homem não quer dizer que tenha que cheirar como um.
Retomo aqui a intenção inicial de pensar possíveis cruzamentos entre a noção de representação e de linguagem performativa: acredito que falar em uma não exclui a outra, pelo fato de que ambas implicam ações que operam para constituir o real. No caso do cinema, existe uma complementação na qual a imagem junto com a fala constrói representações. A imagem, junto com a linguagem tem uma função performativa que constrói algo ao mesmo tempo em que representa e age sobre um sujeito, no caso a personagem, nomeando-o.
Nesse sentido, é preciso lembrar que todos os esforços de Mulan estão canalizados para um objetivo maior: salvar a honra da família, como o representante "masculino" que vai defender seu país na batalha contra os Hunos. Desse modo, só podemos identificá-la como heroína no momento em que a confrontamos com o outro. Entendo que o outro aparece sob duas formas: como os Hunos e como os homens, seus companheiros de exército, tal como estão ali representados.
Como bons vilãos, os Hunos são representados imageticamente em cores escuras, traços pontiagudos, vozes firmes e pausadas, corpos fortes e assustadores. As cores do filme, até então claras e alegres, passam a sombrias quando a cena concentra-se no inimigo. Os vilãos têm poucas aparições e poucos diálogos. Sua presença forte afirma pela imagem o contraste entre as qualidades desejáveis de um herói e as indesejáveis de seu outro. O filme concentra sua atenção na representação de gênero, isto é, volta-se mais diretamente para marcar diferenças entre o feminino e o masculino de sujeitos que estão "do mesmo lado", ou seja, entre os que estão lutando pela libertação do Império Chinês. Sendo Mulan a heroína, ela é apresentada como o modelo a ser seguido, enquanto que o outro está representado pelos soldados que lutam com ela. Ser um homem significa não apenas ser forte, mas também ser grosseiro, mal educado e violento, características que ela precisa adotar para ser reconhecida e respeitada no exército.
É possível ler, então, essa narrativa de dois modos: por um lado, existe a reiteração constante das qualidades que deve ter uma mulher; por outro lado, há a representação do homem como o ser abjeto e, nesse sentido, a performativa presente no filme pode funcionar como reiteração e subversão ao mesmo tempo. Butler (1999) afirma que, no momento em que é estabelecida uma matriz de gênero adotada como normal, tudo o que se encontra fora dela é considerado abjeto. Segundo a autora:

O abjeto designa aqui precisamente aquelas zonas "inóspitas" e "inabitáveis" da vida social que são, não obstante, densamente povoadas por aqueles que não gozam do status de sujeito, mas cujo habitar sob o signo do "inabitável" é necessário para que o domínio do sujeito seja circunscrito. Essa zona de inabitabilidade constitui o limite definidor do domínio do sujeito; ela constitui aquele local de temida identificação contra o qual  e em virtude do qual  o domínio do sujeito circunscreverá sua própria reivindicação de direito à autonomia e à vida. Neste sentido, pois, o sujeito é constituído através da força da exclusão e da abjeção, uma força que produz um exterior constitutivo relativamente ao sujeito, um exterior abjeto que está, afinal, "dentro" do sujeito, como seu próprio e fundante repúdio. (1999, p.155-6).

Mulan penetra nessa zona "inabitável" em função de um objetivo maior que é salvar a honra da família, mas ao mesmo tempo zela pelas qualidades que lhe garantem continuar sendo uma mulher. É possível, então, analisar os atos performativos no filme como algo que reitera/subverte/ reitera a representação feminina. Mulan, ao passar pela experiência de tornar-se um "homem", identifica o outro, aquele sujeito como alguém que não quer ser. Ela sai de casa, vai para o acampamento, passa por treinamentos e, finalmente, no campo de batalha, torna-se responsável pela vitória. Entretanto, em seu retorno para casa, Mulan assume seu comportamento inicial, seu papel de filha, e termina sendo pedida em casamento pelo comandante da tropa.
O comportamento inicial ao qual me refiro é mostrado no início do filme, quando Mulan prepara-se para encontrar a casamenteira , ela relembra quais as qualidades de uma esposa desejável: Calma e reservada, graciosa e delicada, educada, refinada, equilibrada e pontual... Sua mãe e sua avó cantam ainda: A moça vai trazer a grande honra ao seu lar/ achando um bom par/ e com ele se casar./ Mas terá que ser bem calma/ obediente, com bons modos e com muito amor/ Traz mais honra a todas nós. Entretanto, todas essas qualidade deverão ser esquecidas no contato com os soldados. Estes, recrutados sem nenhum critério, apresentam tipos físicos completamente fora dos padrões determinados socialmente, a exceção do comandante Shang, um jovem forte e musculoso, que com determinação e disciplina, consegue preparar os demais soldados para a batalha.
Inicialmente, pensava em analisar o outro representado pela figura dos Hunos, do inimigo; mas a partir do momento em que comecei a observar o filme, percebi que os próprios homens, companheiros de Mulan no exército, desempenham um papel muito mais forte, em termos de qualidades que contribuem para construir o "eu" de Mulan. A masculinidade representada carrega um alto grau de abjeção: os homens são grosseiros, sujos e violentos. O tempo todo, Mulan luta para não abdicar de suas qualidades "femininas". Enquanto toma banho, contra a vontade do dragão, seu protetor, este sai resmungando para si próprio, imitando Mulan: Vá vigiar enquanto eu estrago nosso segredo com essa mania de mulherzinha: higiene!
Segue-se, então, uma série de performativas que partem de um sujeito que existe ali em minoria, e que reitera uma representação de masculinidade com algo abjeto: ao ver um homem batendo em outro, Mulan diz: acho que não vou conseguir e o dragão encoraja-a: é só pegar o jeito, seja agressiva como essa cara aí. Vamos! Dê um soco nele, homem gosta disso. Em outro momento, o comandante vai até Mulan e diz que não quer confusão no acampamento e ela, com voz forte e trejeitos firmes, diz: desculpe a bagunça mas é a masculinidade. Dá vontade de quebrar as coisas, arrotar, falar palavrão... No primeiro dia no acampamento, Mulan acorda para treinar junto com os outros soldados e o dragão lhe diz: vamos! Grita! Me assusta! Bota esse machão pra fora! Já nas fileiras do exército, o comandante dá as primeiras instruções: soldados! Vão se apresentar em ordem e silêncio todas as manhãs! Quem desobedecer será punido. Tal procedimento é semelhante ao que a esposa deve ter ao casar; enquanto os soldados devem estar subordinados ao comandante, a mulher deve estar subordinada ao marido. É um procedimento que funciona, não apenas como modo de subjetivação do sujeito, como também de educação para um contexto sociocultural determinado, através do elenco de uma série de procedimentos que compõe um currículo específico.
Desse modo, ocorre simultaneamente um processo de subjetivação que reafirma a feminilidade de Mulan e que rejeita a masculinidade vigente, contribuindo para reafirmar a posição que ela ocupa naquele contexto de filha exemplar criada para o casamento. Para Butler, esse domínio da abjeção é fundamental na constituição da identidade. Segundo a autora:

A formação de um sujeito exige uma identificação com o fantasma normativo do sexo: essa identificação ocorre através de um repúdio que produz um domínio de abjeção, um repúdio sem o qual o sujeito não pode emergir. Trata-se de um repúdio que cria a valência da "abjeção"  e seu status para o sujeito  como um espectro ameaçador. Além disso, a materialização de um dado sexo diz respeito, centralmente, à regulação de práticas identificatórias, de forma que a identificação com a abjeção do sexo será persistentemente negada. (1999, p. 156)

A experiência pela qual passa a heroína, é permanentemente atravessada pela indesejada identificação com o sexo oposto, materializada em práticas abjetas. Essa desidentificação com as normas regulatórias pelas quais a diferença sexual é materializada (Butler, idem), ao meu ver trabalham muito mais para reforçar a representação de feminilidade que é adotada pelos modelos hegemônicos de pensamento do que para subvertê-las. A feminilidade aparece aqui como o "eu" e a masculinidade como um domínio abjeto. Se, por um lado, essa prática é subversiva, por outro, ela reitera exatamente aquelas características femininas que servem para construir a feminilidade como um dos domínios de abjeção, em relação ao modelo regulatório que é a masculinidade: doçura, fragilidade, submissão.
O sexo de Mulan é revelado após a batalha contra os Hunos na qual ela é ferida. A partir deste momento a forma como ela passa a ser vista por todos muda radicalmente muito menos por ela ter se passado por homem, e muito mais por ela ser uma mulher. Isso fica bem claro nas cenas finais do filme quando o conselheiro imperial, indignado com os acontecimentos, procura Mulan que é protegida por Shang. O conselheiro, então, ordena: Saiam daí! Essa criatura não é digna de proteção. Shang argumenta: É uma heroína! E o conselheiro afirma: Uma mulher? Nunca será digna de nada!
Mas os esforços de Mulan são reconhecidos pelo imperador e ela não somente é condecorada, como também é nomeada conselheira imperial, embora recuse o cargo preferindo voltar para sua família. De volta ao lar, Shang vai ao encontro de Mulan e fica implícito, no filme, um “final feliz”. A rebeldia de Mulan serve, ao final, para que ela alcance o seu objetivo maior: casar e trazer mais honra a sua família.
O filme apresenta uma oscilação constante entre o ato de subverter e o ato de reiterar um sujeito a partir de seu sexo. Quando o sexo de Mulan é descoberto, ela confessa a Mushu que, na verdade, havia feito aquilo tudo por ela mesma, e não por seu pai, como uma forma de provar que poderia fazer bem alguma coisa – uma clara referência ao seu fracasso inicial diante da casamenteira. É, portanto, inevitável que após ter passado por toda a experiência de estar no exército, entre homens e tendo que se comportar como um deles, a Mulan que retorna não é a mesma que partiu.

Referências bibliográficas
AUSTIN, John Langshaw. Quando dizer é fazer: palavras e ação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990. 136p.
BUTLER, Judith. Corpos que pesam: sobre os limites discursivos do “sexo”. In: LOURO, Guacira Lopes. O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 1999. p. 153-172.
DONALD, James. Pedagogia dos monstros: o que está em jogo nos filmes de vampiro? In: SILVA, Tomaz Tadeu da. Pedagogia dos monstros: prazeres da confusão de fronteiras. Belo Horizonte: Autêntica, 2000. p. 105-140.
MIRZOEFF, Nicholas. What is visual culture? In: MIRZOEFF, Nicholas. (Org.). Visual culture reader. Londres: Routledge, 1998. p. 3-13.
SILVA, Tomaz Tadeu da. O currículo como prática de significação. In: O currículo como fetiche: a poética e a política do texto curricular. Belo Horizonte: Autêntica, 1999. p. 07-30.
TURNER, Graemer. O cinema como prática social. São Paulo: Summus, 1997. 174 pp.

“Tolerar a existência do outro,
E permitir que ele seja diferente,
Ainda é muito pouco.
Quando se tolera,
Apenas se concede
E essa não é uma relação de igualdade,
Mas de superioridade de um sobre o outro.
Deveríamos criar uma relação entre as pessoas,
Da qual estivessem excluídas
A tolerância e a intolerância.”
(José Saramago)
“A fim de imaginarmos, de forma aproximadamente precisa, determinada pessoa, temos antes de mais nada de estudar a sua época, fase em que podemos até mesmo ignorá-la, para depois, a ela retornando, encontrar o maior agrado na sua comtemplação.”
(Carta de Goethe a Karl Friedrich Zettei)
“O que eu sou é o que me faz viver.”
(Shakespeare, Henrique III)
“Ante os fatos nem rir, nem chorar, mas compreender.”
(Baruch Espinosa)

“Só não há poder sobre os mortos”
(Walter Benjamin)

PSICOPEDAGOGIA INSTITUCIONAL uma experiência fundamentada na Epistemologia Convergente

RESUMO
Através do tema, a autora propõe apresentar as contribuições da Epistemologia Convergente como instrumento para se pensar sobre as interações no âmbito institucional, na relação de ensinar e aprender, e como forma de atuação preventiva em Psicopedagogia. Esse trabalho é o resultado de discussões permanentes entre profissionais que atuam no contexto escolar e que se preocupam em pensar sobre a aprendizagem como processo de construção coletiva, bem como seus efeitos no contexto escolar. Tais discussões acontecem numa escola do Ensino Fundamental de 1ª a 4ª série, vinculada à rede pública. Com base nas reflexões realizadas, articuladas às contribuições da Epistemologia Convergente, constrói-se uma proposta de mudança nas relações dentro da instituição.
Unitermos: Aprendizagem. Epistemologia Convergente. Psicopedagogia Institucional. Psicologia Social. Zona de Desenvolvimento Real e Proximal.

Introdução
Como a Psicopedagogia pode ser um instrumento de trabalho no âmbito institucional escolar? Será que a atuação da Psicopedagogia ocorre somente quando o psicopedagogo ou a assessoria psicopedagógica é contratada?

Considerando que o objeto de estudo da Psicopedagogia seja a aprendizagem, cria-se a condição de pensar sobre ela além dos contratos estabelecidos, mas como experiências que se complementam no âmbito institucional, frente às diferentes possibilidades de atuação psicopedagógica. Quando se fala sobre a Psicopedagogia na instituição de ensino, existe uma reação imediata dos profissionais da área: trata-se de uma experiência que esta muito longe de se tornar realidade. Só a atuação na clinica é uma possibilidade real com conflitos possíveis de serem administrados.
Sem dúvida, a Psicopedagogia no âmbito institucional, além de ser um campo de estudo que vem se desenvolvendo como ação preventiva importante, é também uma atividade “ameaçadora” para alguns segmentos, pois fortalece a identidade do grupo, que aprende no coletivo e transforma a realidade escolar. As resistências também podem estar ancoradas no que vem sendo produzido como saber psicopedagógico, ou sob a influência das “especializações que especializam” a própria Psicopedagogia, com ênfase no trabalho individual e dissociado, desarticulando as relações e os saberes. “Precisamos tomar cuidado para não fabricarmos dentro de uma disciplina o aparecimento de uma fragmentação tal que descaracterize a própria disciplina. Portanto, quando falamos de Psicopedagogia Clínica e Institucional, não podemos perder de vista que estamos falando de uma mesma disciplina, agindo em âmbitos diferentes.”
Não se pode perder as conquistas históricas de uma Psicopedagogia que surge para se contrapor à fragmentação e tratar a aprendizagem de uma forma inteira, entendendo o indivíduo no aspecto afetivo, cognitivo, social, corporal e de tantas outras formas que se fazem necessárias. Ao se atender uma criança no âmbito clínico, existe a interação com a escola, ou seja, o lugar onde se apresenta o sintoma. O contexto maior estará sempre fazendo parte do dialogo psicopedagógico, não existindo o clínico sem o institucional e vice-versa. Portanto, por mais que não se vislumbre a interação com o campo institucional, ele está presente; dialoga-se com esse contexto o tempo todo, mas se fala dele como se não existisse ou fosse impossível torná-lo realidade. Assim como não se concebe o trabalho institucional como viável, porque a discussão está centrada somente nas definições de papéis para execução de determinadas funções ou porque é tido como função especializada, deixa-se de perceber outras possibilidades que podem existir e estão se constituindo nesse espaço, com o caráter preventivo. É dessa possibilidade que se trata aqui: o indivíduo com a formação em Psicopedagogia, atuando na instituição sem a função específica, mas interatuando, com as experiências e com o olhar psicopedagógico. É pensar na Psicopedagogia de forma articulada, sem rupturas e sem barreiras, com o objetivo de entender como as pessoas aprendem diante das experiências vivenciadas no cotidiano institucional. É, pois uma proposta articulada a um grupo de estudos com profissionais que tem formação em psicopedagogia.

Da Instituição para o Grupo de Estudo e do Grupo para Instituição

A Psicopedagogia, como recurso no âmbito institucional, é o resultado de reflexões que se apóiam no grupo de estudo. O grupo de estudo é um espaço aberto que une as pessoas por objetivos e necessidades em comum, através do diálogo permanente sobre a realidade institucional escolar, tal como se apresenta, com foco na aprendizagem, construindo um saber coletivo e coletivizado.
É no grupo que se organiza a proposta de interesse, mediada por um profissional da área, com o papel de intervir sempre que necessário, através de uma atitude operativa, ou seja, a de ajudar o grupo a pensar autonomamente. Essa postura é inspirada na Psicologia Social, através da técnica de grupos operativos, que tem como “finalidade que seus integrantes aprendam a pensar em uma co-participação do objeto de conhecimento, entendendo-se que pensamento e conhecimento não são fatos individuais, mas produções sociais.”2
As experiências construídas estão relacionadas às contribuições da Epistemologia Convergente como instrumento para pensar sobre as interações no âmbito institucional, na relação de ensinar e aprender, e como forma de atuação preventiva em Psicopedagogia.
A Epistemologia Convergente, idealizada por Jorge Visca3, psicopedagogo argentino que muito contribuiu para uma fundamentação teórico-prática da Psicopedagogia, na América do Sul, integra, simultaneamente, as contribuições da Psicanálise, da Escola de Genebra e da Psicologia Social de Pichon-Rivière. Tal contribuição possibilita uma reflexão a partir da idéia de se articular saberes, proporcionando um melhor fluxo do conhecimento, abrindo caminhos para a compreensão do fenômeno da aprendizagem.
A concepção de aprendizagem apresentada pela Epistemologia Convergente está relacionada ao esquema evolutivo da aprendizagem, através das relações vinculares. Refere-se aos aspectos afetivos e também cognitivos que se estabelecem desde o nascimento, no contato com a função maternante, ampliando-se as relações para a família a comunidade e a escola.
Portanto o aprender não se restringe a escola, mas é inerente ao desenvolvimento humano durante toda a sua existência, através das interações com o outro.
Apoiado na Psicanálise, Visca sustenta que a vinculação afetiva que o indivíduo estabelece com o objeto da aprendizagem pode criar possibilidades e/ou impedimentos, gerando obstáculos que têm a capacidade de impedir ou dificultar a aprendizagem. Assim, o processo de aprendizagem não está dissociado dos aspectos objetivos da realidade vivenciada, nem dos aspectos subjetivos, mediados pela realidade e transformados em experiências que mobilizam ou imobilizam os indivíduos diante de outras experiências. Essa contribuição ajuda a pensar sobre as dimensões afetivas que contracenam com o movimento de aprender, gerando condutas de ansiedade e medos.
No âmbito institucional, as relações grupais estão permeadas de conflitos intensos, reproduzindo nas pessoas obstáculos de várias dimensões. Segundo Visca3, tais obstáculos podem estar relacionados a diferentes áreas: cognitiva, afetiva, funcional e/ou cultural.
Esses obstáculos caracterizam-se pela dificuldade e/ou resistência em aprender, em realizar algumas atividades. Tais condutas podem aparecer associadas ou não, configurando-se como dificuldade à medida que o grupo não consegue se afastar do ponto conflitante para perceber o que coexiste com o problema e tentar superá-lo, transformando e transformando a si mesmo. Portanto, em algum momento, a aprendizagem pode não evoluir por si mesma, necessitando de intervenção; no ambiente institucional, normalmente, esta ocorre de forma espontânea e sem a intencionalidade de aprendizagem qualitativa e reflexiva. “A ação grupal, interação em suas diferentes formas, pode ser regulada a fim de torná-la eficaz, de potencializá-la em vista de seus objetivos.” Nesse sentido, a intenção é instrumentalizar a situação grupal para um processo de intervenção mais elaborado.
Pensar em Psicopedagogia como um olhar articulado e sem barreiras na ação institucional é falar de um exercício psicopedagógico que se constrói no processo, buscando-se caminhos para superar desafios, como parte da aprendizagem do grupo.

A Instituição que se Articula com o Saber Psicopedagogico

Um dos grandes desafios para quem atua em instituição escolar pública é a articulação dos saberes para a produção do trabalho coletivo. Normalmente, tal instituição é um espaço cercado de informações e ações que se cruzam rapidamente, e o tempo disponível nunca é suficiente para as discussões coletivas. O tempo não pára, exigindo habilidades da equipe para lidar com conflitos e necessidades de várias dimensões.
É no interjogo das relações que se estabelecem, em meio a dúvidas e dificuldades encontradas, que algumas experiências cristalizam-se como verdades e parecem impermeáveis às mudanças. Muitas vezes, tem-se que lidar com anos de verdades absolutas, criando uma dicotomia na relação de ensinar e aprender que não deixa espaço para a percepção do outro como parte do processo. Nesse percurso, é muito comum se abandonar o “barco”, como sendo o fim de um projeto de educação possível, porque as condições nem sempre são favoráveis. Entre a condição ideal e a não-ideal, criam-se lacunas cada vez mais significativas e, sem que o grupo perceba, aprende a ser depositário de todos os estereótipos de uma educação sem qualidade.
Com base em tais preocupações, atribui-se à Psicopedagogia no âmbito institucional um papel importante e de aliado, que ajuda o grupo a entender o seu funcionamento e rompe barreiras à aprendizagem, como possibilidades na construção do trabalho educacional coletivo. Através dela, pode-se transformar pensamento linear em pensamento dialético, que mostre as contradições, as resistências, os medos, que criam impossibilidades à aprendizagem e tratam o saber escolar como privilégio de uns em detrimento de outros, com a perda da conotação social e de inclusão.
A instituição que se articula com o saber psicopedagógico é uma instituição que trabalha com a pergunta, com a humanização das relações como processo fundamental para aprendizagem, que não é só do aluno, mas do grupo, e com as mudanças que envolvem conflitos significativos. Portanto, essa perspectiva de trabalho envolve o que Paulo Freire, chamou de paciência histórica. “Somente um ser que é capaz de sair de seu contexto, de „distanciar-se‟ dele para ficar com ele; capaz de admirá-lo para, objetivando-o, transformá-lo e, transformando-o, saber-se transformado pela sua própria criação; um ser que é e está sendo no tempo que é o seu, um ser histórico; somente este é capaz de comprometer-se, não estamos falando de receita mas das interações grupais composta pelo individuo que se manifesta no grupo, e de conflitos decorrentes dessas experiências e que envolvem o tempo do grupo que não é igual ao de nenhum outro.
No âmbito institucional, as contribuições de Pichon-Riviére2 ensinam a importância da interação grupal. Fundamentado na perspectiva da aprendizagem, o aprender a pensar é organizado através da tarefa em grupo com objetivos em comum. No grupo, as pessoas articulam-se para concretizar os objetivos e aprendem a lidar com as ansiedades e obstáculos, a questionar a falta e a buscar soluções. A sistematização do conhecimento se dá através do coletivo. A tarefa educativa como produto da ação coletiva só é possível quando o grupo aprende a transformar a ação individual numa coletiva.
Na escola, esse processo é construído a partir do entendimento de que um não representa ameaça para o outro e que se pode arriscar para conhecer melhor a realidade que compõe a sala de aula e a escola. É possível pedir ajuda trocar experiências, trocar material, sair para passear com alunos, ouvir a família, ouvir o aluno, mudar o jeito de organizar a sala de aula. É possível sentir-se acolhido diante da adversidade; é possível perceber que errando se pode acertar. Trabalha-se com o conceito de aprendizagem que envolve a interação e vai se transformando na medida em que o grupo aprende a dialogar com os conflitos.
As Experiências da Instituição que se Articula com o Grupo de Estudos
A realidade institucional, da qual faz parte a autora, atuando como pedagoga, é permeada por conflitos de ordem social; muitas vezes, para dar conta de tal contexto, é preciso perguntar: por onde começar? A ausência de autoridade na família, a falta de limites na escola e o lugar de autoridade que esta acaba assumindo são fatos que provocam muitas discussões. Tais experiências geram ansiedades, principalmente para o professor; este, muitas vezes, vê o trabalho em sala de aula reduzido a conflitos: desentendimento entre alunos com agressão física, material trazido para a escola indevidamente por alunos e que pode colocar em risco outras crianças, empréstimo de material entre alunos como atividade lucrativa, agressão verbal ao professor, desqualificando a sua função, fatores de ordem emocional que alteram o humor do grupo criando outros impedimentos.
Por outro lado a família procura a escola para pedir ajuda, porque não consegue exercer sua função de autoridade em casa.
São essas histórias e aquelas de outras instituições que compõem o objeto de estudo do grupo para o diálogo institucional. Laura Monte Serrat Barbosa1 traz como reflexão ao grupo, do qual faz parte como mediadora, a necessidade de se entender a instituição partindo-se do conhecimento prévio a respeito da ação que ela produz e da maneira como promove a aprendizagem. Portanto, tratar de uma instituição real é não ignorar a sua realidade. O que se faz nesse processo é tomar a distância necessária para entender o fenômeno e retornar à escola, criando possibilidades em relação ao que foi proposto como sendo a parte do grupo na instituição.
As questões trabalhadas no grupo de estudo são questões do grupo na relação de aprender que se articula em seu espaço de atuação profissional, diante dos desafios que se apresentam. É um grupo que aprende para interagir melhor no que se propõe. E aí está uma diferença importante: não é trabalhar a aprendizagem olhando-a de fora, mas sim se incluir no processo. Na realidade, cada um é porta voz do grupo a que pertence. “Porta voz de um conflito, que é vivido como próprio, mas que, por sua vez, denuncia o conflitivo que é vivido como próprio, mas que, por sua vez, denuncia o conflitivo da situação interativa e da relação com a tarefa.”
Apesar da perspectiva do grupo de estudo estar relacionada com o processo psicopedagógico, a leitura do sintoma exige um pensamento sistematizado que não está dissociado do diagnóstico. Segundo Visca3, é necessária a existência de um instrumento conceitual que faça a ponte entre os aspectos gerais de um estudo diagnóstico, o caso particular que se está investigando e um instrumento que deve orientar a prática do diagnóstico psicopedagógico. Nessa perspectiva, a Epistemologia Convergente possibilita alguns caminhos de acesso para sistematização do conhecimento, organizado através da Matriz do Pensamento Diagnóstico, que é um instrumento conceitual, que possibilita o ir e vir constante, focando e distanciando-se do fenômeno. É isso que permite a reflexão sobre o sintoma da instituição, a instituição em relação ao sintoma e a concepção de mundo, de sociedade que se articula nesse espaço de aprendizagem.
A forma como a instituição representa as suas necessidades pode estar relacionada ao entendimento de determinados assuntos, que são influenciados pela sua concepção de
homem e de sociedade. É possível a indignação diante de alguma atitude de um colega, mas não é possível deixar de considerar que tal atitude é resultado do que ele acredita e do seu próprio processo de aprendizagem. Mobilizar o grupo a seguir em outras direções, buscando mudanças, é estabelecer passo a passo novos caminhos. È interagir no que propõe Vygotsky5: zona de desenvolvimento real e zona de desenvolvimento proximal. Pode-se desafiar o grupo a pensar, a reagir de forma mais elaborada frente aos desafios, mas não se pode exigir que o resultado seja imediato.
“Portanto, na perspectiva de Vygotsky, construir o conhecimento implica numa ação compartilhada, já que é através dos outros que as relações entre sujeito e objeto de conhecimento são estabelecidas”.

Conclusão
Pode-se incluir muitas indagações sobre a forma de atuação da Psicopedagogia no âmbito institucional. Nessa proposta, a atividade está centrada na importância de mobilização do conhecimento de quem tem a formação na área, atuando na inter-relação com as atividades desenvolvidas, tornando possível uma prática psicopedagógica que, apesar de não estar formalizada no espaço de trabalho, compõe a equipe.
Esse percurso, como experiência que vem se construindo, é movido pelo desejo de não ficar indiferente às possibilidades de articulação do saber psicopedagógico ao contexto escolar, através de uma práxis que dialoga com as necessidades, transformando o saber individual em saber coletivo. Assim, gera práticas mais consistentes, que respeitam a singularidade de cada um, permitindo que a equipe escolar consiga lidar com as resistências e os desafios como resultado da sua própria aprendizagem.

Rose Mary da Fonseca Santos pedagoga, psicopedagoga

Referências
1 Barbosa, LMS. A Psicopedagogia no âmbito da instituição escolar. Curitiba: Expoente; 2001.
2 Pichon-Rivière, E. O processo grupal. São Paulo: Martins Fontes; 1988.
3 Visca, J. Clínica psicopedagógica. Epistemologia Convergente. Porto Alegre: Artes Médicas; 1987.

4 Freire, P. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 1981.
5 Vygotsky, LS. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes; 1987.
6 Rego, TC. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis: Vozes; 1995.

Ser um bom professor não significa apenas a capacidade de transferir conhecimento, se faz necessário uma postura reflexiva, capacidade de observar, de regular, de inovar, de aprender com outros.
Ser capaz de desenvolver na criança a capacidade de raciocínio, de posicionamento, tornando-o desafiador, provocador e instigador.

É necessário que tenha competência para identificar os processos pedagógicos que ocorrem no nível das relações sociais mais amplas como nos movimentos sociais organizados, nas ONGs e não somente nos espaços escolares.

O professor, não surge do dia para noite, mas, sim, a partir de um longo e rico processo de formação profissional que lhe possibilita uma atuação consciente e plena de comprometimento social.
Torna-se importante deixar claro que a intenção não é atribuir culpa a esses professores pelo fracasso dos alunos. No entanto, considera-se necessário conscientizá-los de que o sucesso da aprendizagem depende da qualidade de sua prática docente, ou melhor, da sua competência para ensinar.




Para conhecer melhor a problemática iremos estabelecer objetivos como:
• Identificar dados demográficos, como escolaridade,
• Tempo de profissão,
• Tempo de experiência na série, em professores de 1ª e 2ª série do ensino fundamental;
• Verificar o índice de aproveitamento dos alunos por sala de aula;
• Avaliar a competência do professor, pela auto-avaliação, por meio de uma escala de competência pessoal, política e técnica.
• Comparar os resultados da auto-avaliação de competência do professor com o índice de aproveitamento dos alunos e algumas variáveis como grau de escolaridade e experiência profissional.

Material
Ficha de identificação com informações sobre idade, sexo, grau de escolaridade e experiência profissional.
Três características fundamentais para carreira docente e seus aspectos preponderantes:
• Competência pessoal – que se refere aos itens de habilidades que avaliam aspectos da personalidade do professor relacionados à prática docente tais como afetividade, motivação, disciplina e equilíbrio.
• Competência política – refere-se aos itens de habilidades que avaliam o valor político atribuído à atividade docente tanto no âmbito individual como coletivo, tais como compreensão do valor político da educação, ação política no cotidiano escolar, avaliação do impacto da educação.
Competência técnica – refere-se aos itens de habilidades que avaliam os conhecimentos técnicos do professor relacionado à prática docente, tais como técnica de ensino, manejo de classe, domínio de conteúdo, planejamento e avaliação.

Procedimento
Fazer um primeiro contato e coletar dados com todos os participantes, a fim de analisar a questão da competência do docente para ensinar o aluno, explicar a necessidade do sigilo e a liberdade da participação ou não na pesquisa. Fazer levantamento do índice de aproveitamento dos alunos que foram atendidos por eles no ano de 2009.
Em seguida realizar a aplicação da escala de auto-avaliação de competência para ensinar, individual e na própria escola com duração de aproximadamente 40 minutos.
De posse de todos os dados fez-se à descrição e discussão dos resultados sem citar nomes.

21/02/2010
Karmem


A construção de limites e a formação de valores tem sido uma das maiores preocupações dos educadores nestes últimos tempos. Preocupação esta que levou o autor a uma grande reflexão.
Gilson de Almeida Pereira é Pedagogo, especialista em orientação educacional, psicopedagogo, Mestre em educação pela PUCRS e doutorando pela mesma instituição. Desenvolve pesquisas destinadas à formação de professores, por isso o livro “Limites e Afetividade” surgiu de uma dissertação de mestrado.

O livro é muito envolvente, dividido em sete capítulos ao longo de 154 páginas, destaca a importância da afetividade na construção de limites. O autor descreve seis tipos de professores, após três semestres letivos de observações e entrevistas em uma escola. Gilson mostra a postura dos professores através de uma história fictícia.

O primeiro professor é desorganizado, não dá atenção aos alunos, não sabe o que faz e, quando questionado irrita-se. Não consegue administrar o carinho, a atenção, a organização pedagógica e a conduta em sala de aula, ou seja, não sabe lidar com limites e afetividade, nem estabelecer uma interação com os alunos.

O segundo, demonstra uma relação de poder, é exigente e enraivecido, procura manter os alunos ocupados a todo instante.
O terceiro professor, é afetivo e ingênuo, com baixa auto-estima e extremamente religioso. O quarto, varia muito de humor, diversificando as atividades, irrita-se com menos facilidade.

O quinto professor, é extremamente afetuoso e preocupado com seus alunos. Desenvolve um trabalho mais relacionado com a vida de seus alunos, buscando se relacionar com eles, trabalhando com o respeito mútuo e os limites. No entanto, cobra muito com excesso de trabalhos e avaliações.

O sexto não suporta a falta de respeito ou de comprometimento, mas consegue estabelecer limites e, estimula os alunos a resolver suas dificuldades. Tem humor apurado e atitude de respeito mútuo. É rígido e trabalha os limites através de laços afetuosos.
Com essas observações, o autor deixa claro que a postura do professor influencia na disciplina de uma turma. Muitos professores precisam ter o controle de tudo, não permitem conversas e brincadeiras. Com isso, deixam de utilizar recursos e técnicas que poderiam tornar suas práticas pedagógicas mais interessantes e motivadoras. São extremamente autoritários, exercem controle rígido, ditam regras e limites. Os alunos por sua vez, buscam seu espaço para expressar suas idéias, através da indisciplina, respondendo ao abuso da autoridade com atos provocativos.

No decorrer do livro, o autor enfoca “o afeto como fator básico para a construção dos valores e limites, chegando ao ideal do respeito mútuo entre os seres humanos”. De acordo com o tipo de ação adotada pelo professor, autoritária ou libertadora, as relações estabelecerão limites de maneira diferente. Por isso, é tão importante o respeito mútuo, o afeto para que se estabeleçam os limites e o respeito às regras.

O autor afirma ainda: “ o que não significa que, para ser afetuoso, seja necessário dizer somente sim. O afeto está presente no ato, seja este um afago ou uma negação, seja um elogio ou uma repreensão.” Quando o aluno sente-se respeitado e sabe que existe alguém preocupado com ele, que lhe demonstre afetividade, saberá aceitar quando for repreendido ou quando algo lhe é negado.

O livro “ Limites e Afetividade” é uma referência bibliográfica indispensável para todos educadores. Com ele, é possível compreender a importância do afeto na relação professor-aluno, refletir sobre a prática educativa através da análise das posturas descritas. A sua leitura possibilita uma profunda tomada de consciência de nossos atos e da necessidade de buscar alternativas e ações para tornar o ambiente escolar um lugar propício para a aprendizagem, para as relações humanas e para a formação de cidadãos conscientes e afetuosos.
Limites e Afetividade, de Gilson de Almeida Pereira, Editora da Ulbra, Canoas, 2004.



É freqüente essa situação em sala de aula.
Preciso de ajuda. Tenho um aluno que tem demonstrado comportamento inadequado em sala de aula e, perante seus amigos. (2º ano ) A família se recusa a comparecer na escola, visto que sempre é chamada para ouvir reclamações por parte da direção.
Embora algumas vezes demonstre agressividade com os amigos e, até mesmo comigo, quando solicitado está pronto a auxiliar no que for preciso, me abraça e utiliza palavras carinhosas sempre que permitida uma aproximação. Em outros momentos, normalmente de conflitos em sala, grita com todos, não consegue ouvir o que temos para lhe dizer, retrucando tudo o que estamos tentando falar.
Sinto-me cansada e frustrada por não conseguir falar com ele. Os outros alunos ficam indignados com as respostas que ele me dá e, cobram uma postura de punição, visto que percebem sua falta de respeito com a professora. Respirei fundo e falei para ele que hoje conversaríamos que eu iria pensar muito sobre tudo o que aconteceu e decidiria o que faria com ele. Concluindo, queria algo que o fizesse pensar sobre suas atitudes com os amigos, pois chama os pequenos de gay, uma amiga de carrapato, bate em outros amigos e sempre se utiliza da desculpa ”Eles me irritam”, como se os amigos perseguissem ele, mas não é isso o que eu observo. Vejo que ele quer se utilizar de sua força e seu tamanho para intimidar os amigos. E eu, preciso fazer algo, não consigo mesmo ver a situação se arrastar. A família, se chamada, não comparecerá na escola. A direção, não tem nenhum tipo de trabalho educacional, onde poderia realizar algo que fizesse o aluno refletir sobre suas posturas.

Sugestão 1
Lendo o seu relato, lembrei-me de xxxxxxx. Meu amor, minha pedra no sapato, meu príncipe. Ele era um menino ignorado por todos os colegas, porque ele era insuportável mesmo.
Quando cheguei à sala, em meu primeiro dia com eles, a professora que foi apresentar-me, disse logo de cara: Aquele ali, não tem jeito não. É levado, malcriado, brigão. Tem que ficar de mãos dadas com você na hora o recreio, porque arruma logo confusão. Não deixe sair de perto de você por nada.
Eu, de cara séria, olhava de vez em quando para ele e sentia a humilhação que a criança estava passando. Não dei uma palavra sobre o assunto e comecei a minha conversa com a turma. Logo ele levantou e veio pedir para ir ao banheiro. Claro que deixei. E se ele quisesse chorar como eu ia querer, diante de tantas coisas ruins ditas. Ou ele podia querer respirar lá fora, ver o verde das árvores, sei lá. Só sei que nunca neguei o direito deles irem a hora que pedissem. A diretora tinha vontade de estrangular meu pescoço, mas nem ligava.
Aos poucos fui começando a procurar enxergar o ser humano e sempre questionando se daria tempo para que eu fizesse algo por ele. Duas vezes por semana ou até três, mandava sair para o recreio de dois em dois, só para que ele ficasse por último e então eu o chamava para perto de mim, abaixava na sua altura e carinhosamente falava com ele: Querido, vai pro recreio e mostra para todos da escola que você não precisa ficar igual neném de mãos dadas comigo, porque você sabe brincar e tomar conta dos menores. Eu confio em você porque você é meu príncipe.
Ele nunca ficou sem recreio e nunca fiquei tomando conta dele. O povo da escola dizia que eu botava maracujina para ele beber. O pessoal sabia do grande carinho que sentia por ele e nunca conseguiram dar uma bronca nele, porque sempre que aprontava ele mesmo chegava perto e falava assim: Tia aconteceu isso e quem começou foi seu príncipe. Só podia falar para ele, peça desculpas pro amigo e vá brincar. Porque meu acordo com eles era que sempre teriam que falar a verdade porque eu não poderia zangar-se. Mas se falassem mentira e eu descobrisse, a zanga seria enorme. Sempre que ele falava que não era o culpado, deixava passar e ia procurar saber por outras pessoas e sempre o que ele havia dito era a verdade.

Um dia ele teve um ataque de raiva, contra o colega da sala. Segurei-o pelo ombro e fiz com que sentasse. Pedi a ele que respirasse fundo até a raiva passar, isso tudo sem saber se daria certo. E deu certo. Desse dia em diante, sempre que ele pensava em começar uma confusão, eu só falava assim: Matheus, está precisando praticar a respiração para não piorar. Tadinho, ele respirava fundo diversas vezes e dizia depois, Tia já estou bem melhor. Sempre que tinha oportunidade, ficava abraçada com ele, acariciando as costas dele e falando bem baixinho o quanto ele era importante para mim. Tudo isso, foi criando um elo enorme entre nós.
Resolvi pesquisar a vida dele. Chorei diversas vezes com tudo que vinha de informação. Ele tinha que ser violento mesmo, porque sofria demais. Ouviu diversas vezes a mãe dizer que ele devia era morrer. Isso quando ele estava no auge de uma crise de bronquite e ela não conseguia dormir. Colocou o menino para dormir na casa da madrasta dela, onde ele não podia abrir armário, geladeira. O prato dele nunca via uma carne, um ovo. Nada disso. O irmão mais novo tinha pai. Ele nunca soube quem era o pai dele.
O pai do irmão ia à escola buscar o filho de carro, de vez em quando. Ele ia de ônibus, para o mesmo endereço. O irmão ia agasalhado. Ele de chinelo de dedo e camiseta.
Fiquei com esta turma três anos, graças a Deus pude levar o aluno até o 5º ano.

Nesses três anos, ele nunca ficou sem recreio. E quando ele se despediu de mim, meu pensamento foi que tinha certeza que havia feito algo por aquela criança. E se eu tivesse pensado que era mais um e que não iria valer a pena qualquer esforço? Graças a Deus, tudo que fiz, valeu e muito. Bateu-me uma saudade dele agora...
Então, olhe para dentro da criança e enxergue o ser humano. Pensa que esse aluno, foi Deus quem colocou na sua vida, para saber se você é capaz de lidar com o diferente.

Bjs e continue enxergando o ser humano que cada aluno representa. É fácil dar aulas e conviver com os bonitinhos e educadinhos. Isso é fácil demais. Mas nossa jornada é de desafios.
Essa é uma história que ocorre em muitas escolas.






1 - Garatuja: Faz parte da fase sensório-motora e parte da fase pré-operacional. A criança demonstra extremo prazer nesta fase. A figura humana é inexistente ou pode aparecer da maneira imaginária. A cor tem um papel secundário, aparecendo o interesse pelo contraste, mas não há intenção consciente.
Aqui a expressão é o jogo simbólico: "eu represento sozinho". O símbolo já existe.
2 - Pré- Esquematismo: Dentro da fase pré-operatória, aparece a descoberta da relação entre desenho, pensamento e realidade. Quanto ao espaço, os desenhos são dispersos inicialmente, não relaciona entre si. Então aparecem as primeiras relações espaciais, surgindo devido a vínculos emocionais. A figura humana torna-se uma procura de um conceito que depende do seu conhecimento ativo, inicia a mudança de símbolos. Quanto a utilização das cores, pode usar, mas não há relação ainda com a realidade, dependerá do interesse emocional. Dentro da expressão, o jogo simbólico aparece como: "nós representamos juntos".
3 - Esquematismo: Faz parte da fase das operações concretas. Esquemas representativos, afirmação de si mediante repetição flexível do esquema; experiências novas são expressas pelo desvio do esquema. Quanto ao espaço, é o primeiro conceito definido de espaço: linha de base. Já tem um conceito definido quanto a figura humana, porém aparecem desvios do esquema como: exagero, negligência, omissão ou mudança de símbolo. Aqui existe a descoberta das relações quanto a cor; cor-objeto, podendo haver um desvio do esquema de cor expressa por experiência emocional. Aparece na expressão o jogo simbólico coletivo ou jogo dramático e a regra.
4 - Realismo: Também faz parte da fase das operações concretas, mas já no final desta fase. Existe uma consciência maior do sexo e autocrítica pronunciada. No espaço é descoberto o plano e a superposição. Abandona a linha de base. Na figura humana aparece o abandono das linhas. As formas geométricas aparecem. Maior rigidez e formalismo. Acentuação das roupas diferenciando os sexos. Aqui acontece o abandono do esquema de cor, a acentuação será de enfoque emocional. Tanto no Esquematismo como no Realismo, o jogo simbólico é coletivo, jogo dramático e regras.
5 - Pseudo Naturalismo: Estamos na fase das operações abstratas. É o fim da arte como atividade espontânea. Inicia a investigação de sua própria personalidade. Aparecem dois tipos de tendência: visual (realismo, objetividade); háptico (expressão subjetividade). No espaço já apresenta a profundidade ou a preocupação com experiências emocionais (espaço subjetivo). Na figura humana as características sexuais são exageradas, presença das articulações e proporções. A consciência visual (realismo) ou acentuação da expressão, também fazem parte deste período. A expressão aparece como: "eu represento e você vê”. Aqui estão presentes o exercício, símbolo e a regra.
VYGOTSKY E A MENTE HUMANA

Solange Gomes da Fonseca
A psicologia sociohistorica traz seu bojo a concepção de que todo “homem” se constitui como ser humano pelas relações que estabelece com os outros. Desde o nosso nascimento somos socialmente dependentes dos outros e entramos em um processo histórico que, de um lado, nos oferece os dados sobre o mundo e visões, de outro lado, permite a constituição de uma visão pessoal sobre este mesmo mundo.
O momento do nascimento de cada um esta inserido em um tempo e em um espaço em movimento constante.
A historia de nossa vida caminha de forma a processarem toda uma historia de vida integrada com outras muitas historias que se cruzam naquele momento.
Como seres humanos e, portanto, ontologicamente sociais, passamos a construir a nossa historia só e exclusivamente com a participação dos outros e da apropriação do patrimônio cultural da humanidade.
Na teoria sócio interacionista de Vygotsky, encontramos uma visão de desenvolvimento humano baseado na idéia de um organismo ativo cujo pensamento é construído em um ambiente histórico e cultural; a criança reconstrói internamente uma atividade externa, como resultado de processo interativo que se dão ao longo do tempo.
As interações sociais na perspectiva sociohistorica permitem pensar um ser humano em constante construção e transformação que, mediante as interações sociais, conquista e confere novos significados e olhares para a vida em sociedade.
Vygotsky, ao desenvolver sua teoria, parece não ter pretendido criar um modelo simples e linear de transmissão da experiência cultural do adulto para a criança.
O pensamento aparece como dialogo consigo mesmo e o raciocínio como uma argumentação metacognitiva; a atividade mental não é nem pode ser mera copia do dialogo adulto/criança, posto que esta ultima participa ativamente da interação. Desta forma, a internalização não pode ser entendida como adoção passiva do conhecimento previamente apresentado à criança pelo adulto. Antes, é um processo de reconstrução mental do funcionamento interpsicologico.
As proposições de Vygotsky acerca do processo de formação de conceitos nos remetem à discussão das relações entre o pensamento e a linguagem, à questão da mediação cultural no processo de construção de significados por parte do indivíduo, ao processo de internalização e ao papel da escola na transmissão de conhecimentos de natureza diferente daqueles aprendidos na vida cotidiana.
Em A Formação Social da Mente, Vygotsky coloca que: ‘todas as funções no desenvolvimento da criança aparecem duas vezes: primeiro no nível social, e depois no nível individual; primeiro entre pessoas (interpsicologico), e, depois no interior da criança (intrapsicologico) “.
Do mesmo modo as postulações de Vygotsky sobre a formação dos conceitos cotidianos concretizam suas concepções sobre o processo de formação de conceitos científicos remetem a idéia mais geral acerca do desenvolvimento humano.
As dimensões cognitivas e afetivas do funcionamento psicológico tem sido tratadas, ao longo da historia da Psicologia como ciência, de forma separada, nas diferentes tradições dentro dessa disciplina. Atualmente, no entanto, percebe-se uma tendência de reunião desses dois aspectos, numa tentativa de recomposição do ser psicológico completo.
Em termos contemporâneos, Yygotsky poderia ser considerado um cognitivista na medida em que se preocupa com a investigação dos processos internos relacionados à aquisição, organização e uso do conhecimento e, especificamente, com sua dimensão simbólica.
No entanto, é interessante notar, que Vygotsky nunca usou o termo “cognição”. Na verdade, apenas recentemente é que um equivalente mais precisa de cognitivo entrou no léxico da psicologia soviética, com o termo “kognitivnii”. Isto não significa, de forma alguma, que os psicólogos soviéticos não tenham estudado processos como pensamento, percepção e memória. Os termos utilizados por Vygotsky para designar processos que denominamos cognitivos são “funções mentais” e “consciência”.
O desenvolvimento da linguagem serve como paradigma de todo problema examinado. A linguagem origina-se em primeiro lugar como meio de comunicação entre o aluno e o professor, onde começa acontecer a interação. Dito isso, não é necessário sublinhar que a característica essencial da aprendizagem é que engedra a área de desenvolvimento potencial, ou seja, que faz nascer, estimula e ativa no aluno um grupo de processos internos de desenvolvimento no âmbito das inter-relações com outros que, na continuação, são absorvidos pelo curso interior de desenvolvimento e se convertem em aquisições internas do aluno.
Considerada deste ponto de vista, a aprendizagem não é, em si mesma, desenvolvimento, mas uma correta organização da aprendizagem do aluno. Conduz ao desenvolvimento mental, ativa todo um grupo de processos de desenvolvimento. Por isso, a aprendizagem é um momento intrinsecamente necessário e universal para que se desenvolvam no aluno essas características humanas não naturais, mas formadas historicamente.
Para Vygotsky, um aspecto essencial do aprendizado é o fato de ele criar uma zona de desenvolvimento proximal; ou seja, o aprendizado desperta vários processos internos de desenvolvimento, que são capazes de operar somente quando a criança interage com pessoas em seu ambiente e quando em cooperação co m seus companheiros. Uma vez internalizados esses processos tornam, -se parte das aquisições do desenvolvi mento independentemente da criança.
O principal componente inovador da teoria de Vygotsky é a incorporação de fatores sociais na formação de conceitos.
Em Vygotsky os conceitos vão sendo formados individualmente por cada sujeito ate atingirem o estagio de pseudoconceitos. Nesta fase é a mediação da cultura que permite uma convergência dos pseudoconceitos em direção a conceitos compartilhados por um certo agrupamento humano. Sem este papel mediador os pseudoconceitos evoluiriam em direção arbitraria, não, permitindo a vida social.
A obra do psicólogo ressalta o papel da escola no desenvolvimento mental das crianças e, é uma das mais estudadas pela pedagogia contemporânea.
A parte mais conhecida da extensa obra produzida por Vygotsky em seu curto tempo de vida converge para o tema da criação da cultura.
Vygotsky atribui a um papel preponderante às relações sociais nesse processo, tanto que a corrente pedagógica que se originou de seu pensamento é chamada de socioconstrutivismo ou sociointeracionismo.
umário
Transtorno de conduta: uma orientação a educadores
Objetivou-se no presente trabalho informar e orientar os profissionais ligados a educação sobre as principais características, evolução, diagnóstico e tratamento do transtorno de conduta, desde a infância até a fase adulta. Pretendeu-se também esclarecer as principais diferenças entre a indisciplina e o transtorno apontado, bem como ressaltar a importância de um diagnóstico precoce e as possíveis intervenções medicamentosas, terapêuticas, familiares e escolares.
Palavras-Chave: Transtorno de conduta; caracterização da doença; diagnóstico; curso e prognóstico; tratamento.
Aimed to this present job to inform and to manage the professionals connected with the education about the main features, evolution, diagnosis and treatment of conduct disorder, since the childhood until adulthood. It was intended also to explain the main differences between the indiscipline and the conduct emphasized, as well as highlight the importance of an early diagnosis and the possible drug interventions, therapeutic, family and school.
Keywords: < conduct disorder; characterization of disease; diagnosis; course and prognosis; treatment >

INTRODUÇÃOCom base nos relatos de educadores e familiares sobre atitudes inadequadas ou consideradas inaceitáveis para crianças e adolescentes, o artigo levantará algumas considerações importantes sobre o Transtorno de Conduta, desde a infância até a fase adulta. Todavia, serão apontadas os principais aspectos tais como: caracterização do transtorno, diagnóstico, curso e prognóstico, fatores associados ao comportamento, avaliação e tratamento, critérios avaliativos, prevalência e intervenções.
O objetivo do presente trabalho é transmitir algumas informações relevantes aos profissionais ligados à área da educação, com o intuito de informar e diferenciar a indisciplina de um Transtorno de Conduta, tendo em vista os inúmeros casos de violência física e moral que emergem hoje nas salas de aula, nas famílias e na sociedade.
O artigo busca dar subsídios aos educadores, orientando o seu trabalho educacional e visando o bem estar da criança.
Acredito que o esclarecimento de tal transtorno seja válido, pois nota-se que atualmente o número de violência, homicídios e uso de drogas aumenta avassaladoramente, sendo assim, através da informação tentar precocemente amenizar as más condutas.
1.CARACTERIZAÇÃO DO TRANSTORNOAlguns comportamentos apresentados durante a infância podem ser observados no desenvolvimento normal de uma criança, tais como: mentir e matar aula, mas segundo Bordin (2.000, p.01), “Para diferenciar normalidade de psicopatologia, é importante verificar se esses comportamentos ocorrem esporadicamente e de modo isolado ou se constituem síndromes”.
Para que o indivíduo possa se enquadrar no diagnóstico de Transtorno de Conduta deverá ter apresentado nos últimos 12 meses comportamentos que incomodem ou perturbem o próximo, se envolver em atividades perigosas e ilegais, a maioria dos envolvidos não apresentam sofrimento ou constrangimento pelas suas atitudes, bem como não se importam em ferir ou maltratar animais e pessoas moralmente ou fisicamente.
Mondoni (2.006, p.01) ressalta também que, “Comportamentos que transgridem a lei constituem a elinqüência”. Todavia, o que se observa é que este distúrbio do comportamento é mais frequente na infância e adolescência e a primeira causa de encaminhamento ao psiquiatra infantil.
Com base em critérios diagnósticos internacionais (DSM-IV), na infância e na adolescência tais comportamentos fazem parte das categorias Transtorno Desafiador de Oposição (TDO) e Transtorno de Conduta (TC), já na fase adulta, a partir dos 18 anos, se enquadram no Transtorno de Personalidade Antissocial (TPAS).
2.DIAGNÓSTICOSegundo o DSM-IV (1.995) O Transtorno de Conduta implica um padrão repetitivo e persistente de comportamentos no qual são violados os direitos dos outros e regras sociais.
Para que o diagnóstico seja fidedigno, faz-se imprescindível a presença de pelo menos, três das condutas abaixo apontada, e persistente por um período de 12 meses.
•Frequentemente persegue, atormenta, ameaça ou intimida os outros.
•Frequentemente inicia lutas corporais.
•Já usou armas que podem causar ferimentos graves.
•Foi cruel com pessoas, ferindo-as fisicamente.
•Foi cruel com animais.
•Roubou ou assaltou confrontando a vítima.
•Submeteu alguém a atividade sexual forçada.
•Iniciou incêndio com a intenção de provocar sérios danos.
•Destruiu propriedade alheia.
•Arrombou ou invadiu, casas, prédios ou carros.
•Mente ou engana para obter ganhos materiais, favores ou para fugir de obrigações.
•Furtou objetos de valor.
•Frequentemente passa a noite fora, apesar da proibição dos pais.
•Fugiu de casa pelo menos duas vezes, passando a noite fora, enquanto morava com os pais ou substitutos.
•Falta da escola sem motivo, matando aula frequentemente.
Fonte: http://www.psicologia.com.pt/instrumentos/dsm_cid.php
O DSM-IV subdivide o Transtorno de Conduta em dois subtipos: surgimento antes dos 10 anos de idade e após os 10 anos. Tais comportamentos, quando persistentes até a fase adulta (após 18 anos), se caracterizam por Transtorno de Personalidade Antissocial.
O CID-10 aponta que os transtornos de conduta são caracterizados por padrões persistentes de conduta dissocial, agressiva ou desafiante. Tal comportamento deve comportar grandes violações das expectativas sociais próprias à idade da criança; deve haver mais do que as travessuras infantis ou a rebeldia do adolescente e se trata de um padrão duradouro de comportamento (seis meses ou mais) (CID-10, 1993)

O diagnóstico se baseia na presença de condutas do seguinte tipo:
•manifestações excessivas de agressividade e de tirania;
•crueldade com relação a outras pessoas ou a animais;
•destruição dos bens de outrem;
•condutas incendiárias;
•roubos;
•mentiras repetidas;
•cabular aulas e fugir de casa;
•crises de birra e de desobediência anormalmente freqüentes e graves.
Fonte: CID-10, 1993.

A referida norma citada anteriormente, também subdivide o Transtorno de conduta em: socializados e não socializados. Transtorno de conduta não socializado é caracterizado pela presença de um comportamento dissocial ou agressivo persistente associado a uma alteração significativa e global das relações com as outras crianças.
Já os diagnosticados com o transtorno socializado apresentam comportamento dissocial ou agressivo manifestando-se em indivíduos habitualmente bem integrados com seus companheiros.
Segundo Silva (2.002 apud DSM-IV-TR, 2.008, p.207) o diagnóstico dado pelo especialista deve especificar a gravidade do transtorno em leve, moderado e grave.
Baseado nos critérios do CID-10 (1.992/1.993) os indivíduos com Transtorno de Oposição e Desafio e Transtorno de Conduta devem apresentar comportamentos pouco empáticos ou pouco preocupados com os sentimentos, desejos e bem-estar dos outros. Podem não apresentar sentimentos de culpa e remorso, que aprendem a simular para evitar punições. A autoestima é baixa e há reduzida tolerância à frustração, ocorrem acessos de raiva, irritabilidade imprudência, ocasionando um número alto de acidentes.
3.CURSO E PROGNÓSTICOEvidências empíricas sugerem que as primeiras manifestações do comportamento antissocial podem aparecer precocemente, aproximadamente aos 18 meses, onde a criança já apresenta comportamentos como agredir os pais e destruir objetos.
Como visto anteriormente os sintomas do Transtorno de Conduta podem surgir desde a infância e persistir até a fase adulta. Na maior parte dos casos, quando o Transtorno de Conduta surge antes dos 10 anos de idade, é muito comum a presença do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). De acordo com Bordin (2.000, p.03) pode observar-se também “A presença de comportamento agressivo, déficit intelectual, convulsões e comprometimento do sistema nervoso central”.
De acordo com Bordin, o aparecimento do TDAH nos diagnóstico de Transtorno de Conduta pode chegar a 43% dos casos, envolvendo principalmente os meninos, já no sexo feminino é mais comum o aparecimento do quadro de ansiedade e depressão (33% dos casos).
Conforme Mondoni (2.006, p.05) “A prevalência do Transtorno de Conduta varia de acordo com muitos estudos, ficando entre 5 a 10%, sendo 2 a 3 vezes mais comuns em meninos”.
Pacheco et. al.(2.005, p.04) aborda que “Crianças que recebem o diagnóstico de Transtorno Desafiador de Oposição na infância, tendem a apresentar um risco aumentado para desenvolver posteriormente Transtorno de Conduta na adolescência”.
A maior parte das crianças diagnosticadas por Transtorno de Conduta ou Transtorno Desafiador de Oposição tendem a apresentar dificuldades de aprendizagem e fracasso escolar.
O que se observa é que comportamentos antissociais apresentados logo na infância, quando não tratados adequadamente, podem ser protótipos de comportamentos delinquentes para a fase adulta, discórdia conjugal, problemas de relacionamento social, uso de drogas e álcool.
Alguns fatores podem estar associados ao comportamento antissocial da criança. O que se observou em alguns estudos em clínicas psiquiátricas, foi que o ambiente familiar e social desajustado poderiam ser fatores de desencadeamento dos Transtornos.
Conforme aponta Bordin (2.000, p.04) alguns fatores seriam “Receber cuidados maternos inadequados, viver em meio à discórdia conjugal, pais agressivos e violentos, mães com problemas de saúde mental e viver em áreas urbanas”. Ainda esta autora nos afirma que há uma taxa maior de criminalidade nos pais biológicos do que nos pais adotivos, formulando a hipótese de uma predisposição biológica para o comportamento anitssocial.
De acordo com Morana (2.006, p.03) sobre o entendimento desses pacientes “É fundamental se considerar o ambiente em que vive o indivíduo e a interação com ele estabelecida”. Ressalta ainda a autora que a negligência e os maus-tratos recebidos por uma criança em que o cérebro está sendo esculpido pela experiência, induz a uma anomalia da circuitaria cerebral, podendo conduzir à agressividade, hiperatividade, distúrbio da atenção, delinquência e abuso de drogas. (Morana, 2.006)
4.AVALIAÇÃOSegundo Barbieri (2.004, p.02) a avaliação da criança será feita a partir de “Assinalamentos e interpretações desde a primeira entrevista com o paciente e envolvidos com o mesmo, e durante a aplicação de técnicas projetivas”.
Para Morana (2.006, p.04) “A avaliação diagnóstica enfrenta polêmica, pois há uma divergência entre valorização das entrevistas livres ou aplicação de testes padronizados.” Com tudo, há profissionais que se utilizam de entrevistas e outros que se apóiam em testes psicológicos.
De qualquer maneira, independente dos procedimentos utilizados para se fazer o psicodiagnóstico, faz-se importante investigar toda a história de vida do examinado, verificando se há ou não padrão anormal de conduta, tomando como base os critérios estabelecidos pelo DSM-IV e CID-10.
Com base nos estudos e relatos de Barbieri (2.004), para se fazer o diagnóstico do transtorno, foi possível notar o uso dos seguintes instrumentos: entrevistas de anamnese, técnica de Rorschach, sessões psicanalíticas lúdicas, entrevista familiar diagnóstica e devolutiva.
5.TRATAMENTOAs pessoas diagnosticadas pelo Transtorno desafiador de Oposição, Transtorno de Conduta ou Transtorno de Personalidade necessitam de uma excessiva atenção e acompanhamento precoce, com o intuito de se amenizar os comportamentos antissociais.
Os tratamentos citados na literatura são bastante variados, podendo incluir: acompanhamento do indivíduo diagnosticado, intervenções familiares e junto a equipe escolar, orientando e treinando a família, comunidade e professores.
Os melhores resultados têm sido apontados por aqueles que têm por objetivo o tratamento de sintomas específicos, e a terapia comportamental dialética vem recebendo um reconhecimento internacional de sua eficácia em Transtorno de Personalidade. (MORANA, 2.006)
O que se observa é que nenhum tratamento obtém um resultado satisfatório quando aplicado isoladamente, isto é, faz-se necessário uma equipe multidisciplinar atuante, família, paciente, sociedade, escola e terapeuta, para que desta forma se encontre harmonia na intervenção.
No estudo de Bordin (2.000) é ressaltada a importância de se fazer o diagnóstico precocemente e quanto mais jovem o paciente, melhores os resultados obtidos nas intervenções. Neste mesmo estudo é apontada a importância de apoio aos pais, com o objetivo de se estabelecer métodos mais apropriados para educar o filho, bem como o contato do terapeuta com a escola, com o intuito de amparar a equipe pedagógica no relacionamento aluno/professor, aluno/aluno.
O que se nota é que o envolvimento do paciente com oficinas de artes, pintura, música e esportes contribuem bastante para o tratamento do transtorno, pois se observa a oportunidade do indivíduo estabelecer vínculo afetivo com os profissionais responsáveis pelas atividades, além do paciente se sentir capaz na realização das atividades.
Bordin(2.000) aponta ainda que o uso de medicações faz-se necessário somente em casos onde o paciente manifeste convulsões, agressividades ou depressão. Já na fase adulta, caso haja indícios de suicídio, autoagressão ou homicídio, a hospitalização é um dos recursos utilizados.
Outra contribuição que se tem referente ao tratamento do indivíduo diagnosticado com os transtornos acima citados, é a de Barbieri (2.004, p.05 apud GRUSPUN, 2.004) “Práticas como psicoterapia, atendimento psicopedagógico ou mudança do ambiente da criança devem ser acompanhadas por intervenções com os pais, senso a profilaxia da doença dirigida principalmente a eles”.
6.CONSIDERAÇÕES FINAISBuscou-se apresentar no presente trabalho o conceito e intervenções no tratamento de crianças diagnosticadas com Transtorno de Conduta. Com base nos estudos apresentados, podemos concluir que o Transtorno de Conduta é um problema comportamental possível de ser diagnosticado e tratado, evitando seu agravamento no futuro. Muitas vezes esse transtorno pode vir acompanhado de TDAH, o que poderá acarretar em consequências negativas na vida acadêmica, social e familiar da criança.
Faz-se imprescindível um olhar criterioso por parte da equipe pedagógica que acompanha o aluno, avaliando adequadamente os comportamentos apresentados, e se necessário encaminhando-o para os profissionais competentes. Muitos dos comportamentos apresentados atualmente nas escolas públicas e privadas podem ser indícios de Transtorno de Oposição e Desafio ou até mesmo, Transtorno de Conduta.

Fabiane Cristina Favarelli Navega

Bibliografia
REFERÊNCIAS
BARBIERI,V.;JACQUEMIN, A.;ALVES, Z. M. M. B. Alcances e limites do psicodiagnóstico interventivo no tratamento de criança antissociais. In: Paideia. Ribeirão Preto, v. 14, n.28, 2004.
BORDIN, I. A. S.; OFFORD, D. R. Transtorno da conduta e comportamento anti-social. In: Revista Brasileira de Psiquiatria. São Paulo, v.22, n. 2, 2.000.
CID-10 – Classificação de Transtornos Mentais e do Comportamento. Descrições clínicas e Diretrizes Diagnósticas. Porto Alegre. Ed.Artes Médicas, 1993.
DSM-IV – Manual Diagnóstico e Estatístico. Porto Alegre. Ed. Artes Médicas, 1995.
GREVET, E. H. et al. Transtorno de Oposição e Desafio e Transtorno de Conduta: os desfechos no TDAH em adultos. Rio Grande do Sul: Bireme, 2007.n.56, v.1.Disponível em: ? http://www.portal.revistas.bvs.br? Acesso em 27 nov. 2009.
SILVA, A.B.B. Mentes Perigosas. O Psicopata mora ao lado. Rio de janeiro: Ed. Fontanar, 2.008.
MONDONI, Susan. Transtorno de Conduta. São Paulo, 2006. Disponível em : ? HTTP://www.psiquiatriainfantil.com.br? Acesso em : 23 nov. 2009.
MORANA, C.P; STONE, M.H.; ABDALLA FILHO, E. Transtorno de personalidade, psicopatia e serial Killer. In: Revista Brasileira de Psiquiatria. São Paulo, v.28, n.3, 2006.
PACHECO,J.; ALVARENGA P.; REPPOLD, C.; PICCININI, C.A.; HUTZ, C.S. Estabilidade do comportamento antissocial na transição da infância para a adolescência: uma perspectiva desenvolvimentista.In: Revista Psicologia: Reflexão e Crítica. Porto Alegre, v. 18, n.01, 2005.
PSICOLOGIA. Psiquiatria geral. Coordenado por: GJBallone. Disponível em: Acesso em: 19 maio 2010.
Publicado em 04/02/2011 17:13:00
Currículo(s) do(s) autor(es)
Fabiane Cristina Favarelli Navega - (clique no nome para enviar um e-mail ao autor) -
Aluna do curso de pós-graduação do curso de Psicopedagogia pela Universidade Anhanguera. Formada em Pedagogia com habilitação em Educação Especial pela UNIMEP (2.000) atua na área da educação desde janeiro de 2.001.


Um psicopedagogo na sua prática escolar tem papel de mediador, ele faz uma intervenção, “não apenas da aula”, sobre um tema. Essa intervenção é levantar hipóteses, rever conceitos, descobrir determinadas crenças sobre o aprender e o ensinar e assim permitir a construção de um espaço para troca de experiências e idéias, além de propor uma metodologia onde o refletir e o pensar não seja tarefa sem prazer, sem alegria, sem vida.
Considerando a escola responsável por grande parte da formação do ser humano, o trabalho do Psicopedagogo na instituição escolar tem um caráter preventivo no sentido de procurar criar competências e habilidades para solução dos problemas. Com esta finalidade e em decorrência do grande número de crianças com dificuldades de aprendizagem e de outros desafios que englobam a família e a escola, a intervenção psicopedagógica ganha, atualmente, espaço nas instituições de ensino.
Numa linha preventiva, o psicopedagogo pode desempenhar uma prática docente, envolvendo a preparação de profissionais da educação, ou atuar dentro da própria escola.
Na sua função preventiva, cabe ao psicopedagogo:
• Detectar possíveis perturbações no processo de aprendizagem;
• Participar da dinâmica das relações da comunidade educativa a fim de favorecer o processo de integração e troca;
• Realizar processo de orientação educacional, vocacional e ocupacional, tanto na forma individual quanto em grupo.
• Avaliar o processo metodológico na escola como um todo e orientar novas metodologias de acordo com as características dos indivíduos e do grupo; acompanhando a relação professor e aluno, aluno e aluno;
• Acompanhar o aluno que vem de outra escola, sugerindo atividades, buscando estratégias e apoio e quando necessários.
Acreditamos que, se existissem nas escolas psicopedagogos trabalhando com essas dificuldades, o número de crianças com problemas seria bem menor.
O psicopedagogo deve considerar que a escola, o professor e família interferem positiva ou negativamente no processo de aprendizagem.
Em relação à escola, avalia-se também a forma como está organizada, inclusive a sua estruturação hierárquica, sua orientação de trabalho, os conflitos internos e o seu projeto pedagógico.
Nos professores, observa-se:
• a forma de circulação do conhecimento utilizada;
• o comprometimento com o trabalho;
• o zelo pelo aluno e pela aprendizagem;
• as transferências realizadas durante a interação com cada estudante;
• o estímulo que é capaz de provocar ao apresentar seu saber;
• a formação que possui que o habilitará a identificar as dificuldades escolares a partir da interpretação dos processos mentais que levaram o aluno a responder desta ou daquela forma;
• a conduta pedagógica - se respeita ou não o conhecimento trazido pelo aluno.
Na família é possível observar:
• sua função social e as funções de cada elemento da família;
• as formas de circulação do conhecimento;
• as normas que a regulamentam;
• as resistências;
• a identidade dessa família (ideologias, crenças etc);
• as expectativas e conflitos.
Os desafios que surgem para o psicopedagogo dentro da escola relacionam-se de modo significativo. A sua formação pessoal e profissional implicam a configuração de uma identidade própria e singular que seja capaz de reunir qualidades, habilidades e competências de atuação na instituição escolar.
Ao psicopedagogo escolar cabe avaliar o aluno e identificar os problemas de aprendizagem, buscando conhecê-lo em seus potenciais construtivos e em suas dificuldades, encaminhando-o, por meio de um relatório, quando necessário, para outros profissionais - psicólogo, fonoaudiólogo, psicopedagoga clínico, neurologista, etc., que realizam diagnóstico especializado e exames complementares com o intuito de favorecer o desenvolvimento da potencialização humana no processo de aquisição do saber.

Segundo Dembo (apud FERMINO et al, 1994, p.57), "Evidências sugerem que um grande número de alunos possui características que requerem atenção educacional diferenciada". Neste sentido, um trabalho psicopedagógico pode contribuir muito, auxiliando educadores a aprofundarem seus conhecimentos sobre as teorias do ensino-aprendizagem e as recentes contribuições de diversas áreas do conhecimento, redefinindo-as e sintetizando-as numa ação educativa.
Esse trabalho permite que o educador se olhe como aprendente e como ensinante.
Além do já mencionado, o psicopedagogo está preparado para auxiliar os educadores realizando atendimentos pedagógicos individualizados, contribuindo para a compreensão de problemas na sala de aula, permitindo ao professor ver alternativas de ação e ver como as demais técnicas podem intervir.
Para o psicopedagogo, a experiência de intervenção junto ao professor, num processo de parceria, possibilita uma aprendizagem muito importante e enriquecedora, principalmente se os professores forem especialistas nas suas disciplinas. Não só a sua intervenção junto ao professor é positiva. Também o é a sua participação em reuniões de pais esclarecendo o desenvolvimento dos filhos assim como em conselhos de classe.
Segundo Bossa (1994, p.23),
[...] cabe ao psicopedagogo perceber eventuais perturbações no processo aprendizagem, participar da dinâmica da comunidade educativa, favorecendo a integração, promovendo orientações metodológicas de acordo com as características e particularidades dos indivíduos do grupo, realizando processos de orientação. Já que no caráter assistencial, o psicopedagogo participa de equipes responsáveis pela elaboração de planos e projetos no contexto teórico/prático das políticas educacionais, fazendo com que os professores, diretores e coordenadores possam repensar o papel da escola frente a sua docência e às necessidades individuais de aprendizagem da criança ou, da própria “ensinagem‟.
O estudo psicopedagógico atinge seus objetivos quando, ampliando a compreensão sobre as características e necessidades de aprendizagem de determinado aluno, abre espaço para que a escola viabilize recursos para atender às necessidades de aprendizagem. Para isso, deve analisar o Projeto Político-Pedagógico, sobretudo quais as suas propostas de ensino e o que é valorizado como aprendizagem. Desta forma, o fazer psicopedagógico se transforma podendo se tornar uma ferramenta poderosa no auxílio de aprendizagem.
A PSICOPEDAGOGIA INSTITUCIONAL
Por Simone Carlberg
Entende-se que a Psicopedagogia Institucional não está relacionada somente a instituição escolar, pois pode ser pensada também na dimensão hospitalar e empresarial. No entanto, o enfoque dado nesse texto será o escolar.
O Psicopedagogo que pretende atuar na Instituição escolar tem duas possibilidades: poderá ser contratado por uma ou ele poderá ser assessor de várias. Enquanto Contratado, o Psicopedagogo tem, em princípio, as seguintes tarefas (listagem reelaborada a partir do paralelo entre o Professor, Psicopedagogo Clínico e Institucional de autoria de Neide de Aquino Noffs):
• Administrar ansiedades e conflitos;
• Trabalhar com grupos - grupo escolar é uma unidade em funcionamento;
• Identificar sintomas de dificuldades no processo ensino-aprendizagem;
• Organizar projetos de prevenção;
• Clarear papéis e tarefas nos grupos;
• Ocupar um papel no grupo;
• Criar estratégias para o exercício da autonomia (aqui entendida segundo a teoria de Piaget: cooperação e respeito mútuo);
• Fazer a mediação entre os subgrupos envolvidos na relação ensino-aprendizagem (pais, professores, alunos, funcionários);
• Transformar “queixas em pensamentos” (Alícia Fernandéz)
• Criar espaços de escuta;
• Levantar hipóteses;
• Observar, entrevistar e fazer devolutivas;
• Utilizar-se de metodologia clínica e pedagógica, “olhar clínico”;
• Estabelecer um vínculo psicopedagógico;
• Não fazer avaliação psicopedagógica clínica individual dentro da instituição escolar, porém, pode fazer sondagens;
• Fazer encaminhamentos e orientações;
• Compor a equipe técnica-pedagógica;

Para tanto, necessita de supervisão e formação pessoal. Algumas dessas tarefas também podem ser desempenhadas pelo Psicopedagogo Assessor, porém a principal e fundamental diferença é que ele não ocupa um papel no grupo. O que isso quer dizer? Enquanto unidade em funcionamento, um grupo é composto por pessoas que têm características diferentes, porém, para funcionar como tal, é necessário que cada elemento tenha uma função e um papel nele.
O Psicopedagogo Contratado ocupa um e outro no grupo institucional, que pode ser de liderança ou não. Sendo assim, ele pode estar ocupando um papel que não lhe permite enxergar tudo aquilo que é necessário; é como se ele estivesse misturado aos demais. Isto o impede de ter uma distância suficientemente boa para perceber o que é seu, do grupo, ou ainda, o que é resultado do funcionamento grupal. Já o Psicopedagogo assessor, pelo menos em tese, tem o privilégio de manter uma distância suficientemente boa para observar o funcionamento de um grupo e poder, inicialmente, levantar hipóteses diagnósticas e, posteriormente, propor e executar o processo corretor. O fato de uma instituição escolar ter em seu quadro um psicopedagogo institucional contratado, não invalida ou, não substitui as tarefas que só podem ser executadas por um assessor, ou seja, alguém que vem de fora vê de fora, pontua, revela, identifica o latente naquilo que está manifesto.

AÇÃO PSICOPEDAGÓGICA E A TRANSFORMAÇÃO DA REALIDADE ESCOLAR
A atuação do Psicopedagogo na instituição visa a fortalecer-lhe a identidade, bem como buscar o resgate das raízes dessa instituição, ao mesmo tempo em que procura sintonizá-la com a realidade que está sendo vivenciada no momento histórico atual, buscando adequar essa escola às reais demandas da sociedade.
Durante todo o processo educativo, procura investir numa concepção de ensino-aprendizagem que:
Fomente interações interpessoais;
Incentive os sujeitos da ação educativa a atuarem considerando integradamente as bagagens intelectuais e moral;
Estimule a postura transformadora de toda a comunidade educativa para, de fato, inovar a prática escolar; contextualizando-a;
Enfatize o essencial: conceitos e conteúdos estruturantes, com significado relevante, de acordo com a demanda em questão;
Oriente e interaja com o corpo docente no sentido de desenvolver mais o raciocínio do aluno, ajudando-o a aprender a pensar e a estabelecer relações entre os diversos conteúdos trabalhados;
Reforce a parceria entre escola e família;
Lance as bases para a orientação do aluno na construção de seu projeto de vida, com clareza de raciocínio e equilíbrio;
Incentive a implementação de projetos que estimulem a autonomia de professores e alunos; Atue junto ao corpo docente para que se conscientize de sua posição de “eterno aprendiz”, de sua importância e envolvimento no processo de aprendizagem, com ênfase na avaliação do aluno, evitando mecanismos menores de seleção, que dirigem apenas ao vestibular e não à vida.
Nesse sentido, o material didático adotado, após criteriosa análise, deve ser utilizado como orientador do trabalho do professor e nunca como o único recurso de sua atuação docente. Com certeza, se almejamos contribuir para a evolução de um mundo que melhore as condições de vida da maioria da humanidade, nossos alunos precisam ser capazes de olhar esse mundo real em que vivemos interpretá-lo, decifrá-lo e nele ter condições de interferir com segurança e competência.
Para tanto, juntamente com toda a Equipe Escolar, o Psicopedagogo estará mobilizado na construção de um espaço concreto de ensino- aprendizagem, espaço este orientado pela visão de processo, através do qual todos os participantes se articulam e mobilizam na identificação dos pontos principais a serem intensificados e hierarquizados, para que não haja ruptura da ação, e sim continuidade crítica que impulsione a todos em direção ao saber que definem e lutam por alcançar.
Considerando a escola responsável por parcela significativa da formação do ser humano, o trabalho psicopedagógico na instituição escolar, que podemos chamar de psicopedagogia preventiva, cumpre a importante função de socializar os conhecimentos disponíveis, promover o desenvolvimento cognitivo e a construção de normas de conduta inseridas num mais amplo projeto social, procurando afastar, contrabalançar a necessidade de repressão.
Assim, a escola, como mediadora no processo de socialização, vem a ser produto da sociedade em que o indivíduo vive e participa. Nela, o professor não apenas ensina, mas também aprende. Aprende conteúdos, aprende a ensinar, a dialogar e liderar; aprende a ser cada vez mais um cidadão do mundo, coerente com sua época e seu papel de ensinante, que é também aprendente. Agindo assim, a maioria das questões poderá ser tratada de forma preventiva, antes que se tornem verdadeiros problemas.
Em sua obra “A Psicopedagogia no Brasil- Contribuições a Partir da Prática”, Nádia Bossa registra o termo prevenção como referente à atitude do profissional no sentido de adequar as condições de aprendizagem de forma a evitar comprometimentos nesse processo, Partindo da criteriosa análise dos fatores que podem promover como dos que têm possibilidade de comprometer o processo de aprendizagem, a Psicopedagogia Institucional elege a metodologia e/ou a forma de intervenção com o objetivo de facilitar e/ou desobstruir tal processo, o que vem a ser sua função precípua, colaborando, assim, na preparação das gerações para viver plenamente a complexidade característica da época. Sabemos que o aluno de hoje deseja que sua escola reflita a sua realidade e o prepare para enfrentar os desafios que a vida social apresenta, portanto não aceita ser educado com padrões já obsoletos e ultrapassados.
“A psicopedagogia trabalha e estuda a aprendizagem, o sujeito que aprende aquilo que ele está apontando como a escola em seu conteúdo sociocultural. É uma área das Ciências Humanas que se dedica ao estudo dos processos de aprendizagem. Podemos hoje afirmar que a Psicopedagogia é um espaço transdisciplinar, pois se constitui a partir de uma nova compreensão acerca da complexidade dos processos de aprendizagem e, dentro desta perspectiva, das suas deficiências.” (Nívea M. C. Fabrício).

A INTERVENÇÃO JUNTO À FAMÍLIA
“Uma das contribuições da psicopedagogia é no contexto familiar, ampliando a percepção sobre os processos de aprendizagem de seus filhos, resgatando a família no papel educacional complementar à escola, diferenciando as múltiplas formas de aprender, respeitando as diferenças dos filhos (Bossa, 1994)
O conhecimento e o aprendizado não são adquiridos somente na escola, mas também são construídos pela criança em contato com o social, dentro da família e no mundo que a cerca. A família é o primeiro vínculo da criança e é responsável por grande parte da sua educação e da sua aprendizagem.
É por meio dessa aprendizagem que a criança é inserida no mundo cultural, simbólico e começa a construir seus conhecimentos, seus saberes.

Contudo, na realidade, o que temos observado é que as famílias estão perdidas, não estão sabendo lidar com situações novas: pais trabalhando fora o dia inteiro, pais desempregados, brigas, drogas, pais analfabetos, pais separados e mães solteiras. Essas famílias acabam transferindo suas responsabilidades para a escola, sendo que, em decorrência disso, presenciamos gerações cada vez mais dependentes e a escola tendo que desviar de suas funções para suprir essas necessidades.
De pouca valia será comunicar o diagnóstico à família e fazer as intervenções se não houver o engajamento e atuação da mesma no processo terapêutico. De acordo com o artigo 1º, capítulo 1 – Dos Princípios, o Código de Ética da ABP, elaborado pelo Conselho Nacional do Biênio 91\92 e reformulado pelo Conselho Nacional e Nato do Biênio 95\96, afirma-se que “a psicopedagogia é um campo de atuação em educação e saúde que lida com o processo de aprendizagem humana, seus padrões normais e patológicos, considerando a influência do meio, família, escola e sociedade no seu desenvolvimento, utilizando procedimentos próprios da psicopedagogia”.
A escola, como observa Sarramona (apud IGEA, 2005, p 19), veio ocupar uma das funções clássicas da família que é a socialização: “A escola se converteu na principal instituição socializadora, no único lugar em que os meninos e as meninas têm a possibilidade de interagir com iguais e onde se devem submeter continuamente a uma norma de convivência coletiva [...]”. Considerando o exposto, cabe ao psicopedagogo intervir junto à família das crianças que apresentam dificuldades na aprendizagem, por meio, por exemplo, de uma entrevista e de uma anamnese com essa família para tomar conhecimento de informações sobre a sua vida orgânica, cognitiva, emocional e social. O que a família pensa, seus anseios, seus objetivos e expectativas com relação ao desenvolvimento de seu filho também são de grande importância para o psicopedagogo chegar a um diagnóstico.

Vale lembrar o que diz Bossa (1994, p.74) sobre o diagnóstico:
O diagnóstico psicopedagógico é um processo, um contínuo sempre revisável, onde a intervenção do psicopedagogo inicia segundo vimos afirmando, numa atitude investigadora, até a intervenção. É preciso observar que esta atitude investigadora, de fato, prossegue durante todo o trabalho, na própria intervenção, com o objetivo de observação ou acompanhamento da evolução do sujeito. Na maioria das vezes, quando o fracasso escolar não está associado às desordens neurológicas, o ambiente familiar tem grande participação nesse fracasso. Boa parte dos problemas encontrados é lentidão de raciocínio, falta de atenção e desinteresse. Esses aspectos precisam ser trabalhados para se obter melhor rendimento intelectual. Lembramos que a escola e o meio social também têm a sua responsabilidade no que se refere ao fracasso escolar. A família desempenha um papel decisivo na condução e evolução do problema acima mencionado, pois, muitas vezes, não quer enxergar essa criança com dificuldades, essa criança que, muitas vezes, está pedindo socorro, pedindo um abraço um carinho, um beijo e que não produz na escola para chamar a atenção para o seu pedido, a sua carência. Esse vínculo afetivo é primordial para o bom desenvolvimento da criança.
Concordamos com Souza (1995, p.58) quando diz que [...] fatores da vida psíquica da criança podem atrapalhar o bom desenvolvimento dos processos cognitivos, e sua relação com a aquisição de conhecimentos e com a família, na medida em que atitudes parentais influenciam sobremaneira a relação da criança com o conhecimento. Sabemos que uma criança só aprende se ela tem o desejo de aprender. E para isso é importante que os pais contribuam para que ela tenha esse desejo.
Existe um desejo por parte da família quando a criança é colocada na escola, pois da criança é cobrado que seja bem-sucedida. Porém, quando esse desejo não se realiza como esperado, surgem à frustração e a raiva que acabam colocando a criança num plano de menos valia, surgindo, daí, as dificuldades na aprendizagem. Para Boszormeny (apud Polity, 2000),
[...] uma criança pode desistir da escola porque aceita uma responsabilidade emocional, encarregando-se do cuidado de algum membro da família. Isso se produz, em resposta à depressão da mãe e da falta de disponibilidade emocional do pai que, de maneira inconsciente, ratifica a necessidade que tem a esposa, que seu filho a cuide. A intervenção psicopedagógica também se propõe a incluir os pais no processo, por intermédio de reuniões, possibilitando o acompanhamento do trabalho realizado junto aos professores. Assegurada uma maior compreensão, os pais ocupam um novo espaço no contexto do trabalho, abandonando o papel de meros espectadores, assumindo a posição de parceiros, participando e opinando.
Sabe-se que o afetivo influencia no desenvolvimento do indivíduo, também no aspecto cognitivo, o que potencializa a importância da família no processo de aprendizagem do mesmo. “O afetivo é indispensável para energizar e dar a direção ao ato motor e cognitivo. Assim como o ato motor é indispensável para expressão do afetivo, o cognitivo é indispensável na avaliação das situações que estimularão emoções e sentimentos. Em seus eventuais bloqueios, a afetividade pode estar operando de forma a impedir a aprendizagem.
Dessa forma, mudanças de atitudes na família com relação ao processo de aprendizagem de seus filhos são de grande importância para propiciar afetividade que encoraje na criança à vontade, interesses, necessidades, motivações que dirigirão escolhas e se constituirão força motivadora para o desenvolvimento dentro do processo e superação de dificuldades de origem emocional, familiar e psicológica. Fatos como a separação dos pais o nascimento de um irmão, a morte de um animalzinho de estimação e muitas outras ocorrências traumáticas, não elaboradas pelo sujeito, podem comprometer o seu processo de aprendizagem.

“As características da família, da escola e da comunidade, ou até mesmo do professor podem ser a causa desencadeante do problema de aprendizagem. Ainda que o psicopedagogo quisesse, ser-lhe-ia impossível negar a família; não é possível excluir do processo de aprendizagem esse elemento, cujo influxo sobre o próprio sujeito é marcante. A natureza das causas do problema aponta para o psicopedagogo, na hora de sua intervenção. A melhor forma dele atuar”. (Bossa, 1994)
Na orientação familiar, há de se considerar os diferentes diagnósticos para se proceder aos encaminhamentos. É procedimento comum, no entanto, informar a família as causas do problema de aprendizagem apontando, o que ele significa e a importância de não diferenciar o filho por este motivo, assim como as atitudes que se deve desenvolver perante o problema, objetivando mudanças, de modo a influenciar de forma positiva o acompanhamento dado pelo psicopedagogo.
Um exemplo é que pais de filhos portadores de TDAH precisam entender que eles têm capacidades enormes e não apresentam déficit de inteligência, precisam simplesmente de estímulos na organização.
Outro exemplo refere-se à dislexia. Um disléxico bem orientado encontra alternativas para driblar os sintomas do distúrbio. Diante de suas dificuldades é comum que os disléxicos sejam taxados de incapaz por seus parentes e amigos. Neste caso, as orientações para a família são de suma importância para o tratamento, pois se evita constrangimentos e impactos nefastos sobre sua auto-estima, como a depressão e outros. Uma orientação familiar pode indicar estratégias como gravar textos dos livros didáticos, o que ajuda na memorização, capacidade bem prejudicada num disléxico, e informar a família quanto aos direitos previstos em lei federal que determina que pessoas com algum distúrbio de aprendizagem têm o direito de receber avaliação personalizada.

É de suma importância que o psicopedagogo assuma uma postura de investigador procurando conhecimentos que embasem sua pratica. Conhecer como se deu a organização das famílias no Brasil, sua base de colonização e escravidão, o autoritarismo e a violência presente nesse contexto, da ao psicopedagogo uma visão histórica da origem das práticas pedagógicas baseadas no castigo físico, por exemplo, e desta forma, como a sucessão desta prática de geração para geração acabou por determinar ouso do castigo corporal como medida disciplinar aceita por muitos. A orientação neste caso é de não bater nos filhos, já que essa forma e imitada pelos filhos na convivência com outras crianças.
Conhecer as fases de desenvolvimento da criança e informar aos pais sobre o que é esperado em cada uma delas esclarece e diminui a ansiedade dos mesmos com relação às atitudes dos filhos. A família deve conhecer a sua importância na formação da personalidade da criança, a partir dos primeiros vínculos. De acordo com Bowby e Ainsworth, “o vínculo afetivo é um laço relativamente duradouro e que o parceiro é importante como indivíduo único e não pode ser trocado por nenhum outro. Em um vínculo afetivo, existe o desejo de manter aproximidade com o parceiro.”
Muitas vezes a família tem um alto nível de expectativa em relação ao desempenho da criança e a cobra de forma exagerada; isso gera na criança um quadro de estresse elevado e uma baixa auto-estima. Uma criança com distúrbio emocional não tratado torna-se desajustada; daí a importância de um encaminhamento pelo psicopedagogo para um acompanhamento psicológico e antes disso, uma orientação familiar, que bem feita pode eliminar a procura por outro profissional.
É natural que os pais queiram ver os filhos felizes, produtivos, e na medida em que isso não ocorre mostram-se extremamente decepcionados, frustrados, cobrando ou mesmo agredindo essa criança, ou muitas vezes mostrando-se apáticos, deixando de lado demonstrações de afeto, geralmente quando o filho está mais precisando.

Deve-se esclarecer que uma das principais maneiras de ajudar uma criança, seja ela deprimida ou não, é ensiná-la a ser otimista, pois o otimismo é considerado um antídoto contra a depressão e o estresse. Para isso é importante que os pais observem a forma como criticam seus filhos devendo ser precisos e adotar um estilo explicativo otimista. A repreensão precisa e otimista é construtiva, pois gera responsabilidade e vontade de mudar, quando a criança já está deprimida muitas vezes são necessárias medidas mais ativas, como a procura de um profissional mais especializado.
O psicopedagogo tem um papel importante na observação dos sintomas de depressão na criança, pois o que a princípio é colocado como um problema de aprendizagem, na realidade é uma conseqüência da falta de motivação para aprendizagem, ocorrendo um grande medo de fracassar e uma avaliação distorcida de seu desempenho escolar, achando-se incapaz de aprender. Há, portanto uma interferência da depressão no desenvolvimento cognitivo e desempenho escolar.
Por essa e por outras tantas situações que se revela a importância da orientação familiar na solução dos problemas de aprendizagem apresentadas em um consultório. É o encaminhamento desta orientação que aumentará as possibilidades de sucesso no tratamento, sempre tendo em vista a participação efetiva da família.
Concluindo, na atuação escolar, junto com educadores, o psicopedagogo, através de discussões e atividades lúdicas, contribui para o esclarecimento das dificuldades escolares, que podem ser decorrentes da organização administrativa do sistema escolar e familiar, das relações truncadas entre professor e aluno, das exigências pedagógicas inadequadas, das expectativas familiares, das formas de circulação do conhecimento do professor e da família e das modalidades de aprendizagem que, segundo Alicia Fernandez, são passadas de pai para filho, determinando como serão as relações do sujeito aprendente com o saber, levando em consideração as crenças, os mitos, as mensagens repassadas na comunicação familiar.

INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA POSSÍVEL NA SALA DE AULA
Trabalhar com crianças que nos apresentam alguma dificuldade requer muita afetividade, perspicácia, alegria, calma e paciência, tudo isso exige do educador uma postura, uma atitude que vem de dentro da pessoa, no sentido psicanalítico, aceitação, firmeza, tentando ajudar a conduzir a criança, com participação ativa dos pais a ir vencendo pequenos obstáculos, dentro do processo de desenvolvimento, sempre através de tomadas de consciência de si mesma, do que faz de tudo e todos que estão à sua volta.
Os pais vão percebendo, por sua vez, que o filho não é tão incapaz como eles pensavam, vão percebendo as atividades de que ele gosta que o faz feliz, até dar gargalhada ou bater palmas espontâneas, se interessam, de certo modo, por repetí-las e criar aspectos novos em casa, mais ainda, começam a ver o filho com outros olhos, a acreditar mais nele. Isso vai concorrer para a melhora da auto-imagem da criança, do sentir-se capaz de, e isso é o grande incentivo a que ele procure vencer, superar os obstáculos no seu caminho de aprendizado.
Esse trabalho pode ser feito a partir de agrupamentos produtivos, atividades lúdicas, sempre partindo de um planejamento bem feito.
Ao realizar o planejamento, o professor que atua com uma postura psicopedagógica, antes de organizá-lo considera as vivências, os conhecimentos e as informações que o aluno carrega e a sua forma de ver e de viver no mundo moderno, para optar por uma forma metodológica que auxilie a transpor o conteúdo sistematizado, científico e promover uma aprendizagem significativa.

AGRUPAMENTOS PRODUTIVOS
É na interação que os alunos aprendem, por isso é imprescindível que o professor planeje situações didáticas em que os alunos estejam agrupados criteriosamente e possam trocar pontos de vista, negociar e chegar a um acordo. Vygotsky nos diz que o aluno não é tão somente o sujeito da aprendizagem, mas, aquele que aprende junto ao outro o que o seu grupo social produz, tal como: valores, linguagem e o próprio conhecimento. As interações e os agrupamentos devem ser pensados tanto do ponto de vista do que se pode aprender durante a atividade como do ponto de vista das questões que cada aluno pode levar para pensar. Outro fator importante a considerar, além do conhecimento que os alunos possuem, são suas características pessoais, seus traços de personalidade, a disposição de realizar atividades em parceria com um determinado colega e outro. Às vezes, a tomar pelo nível de conhecimento, a dupla poderia ser perfeita, mas o estilo pessoal de cada um indica que é melhor não junta-lo, pois o trabalho tenderia a ser improdutivo. Agrupamento produtivo consiste em reunir dois alunos com níveis de compreensão parecidos, para que possam pensar tomar decisões juntos.
Apenas algumas crianças têm necessidade de atendimento individual, aquelas que, por algum motivo, como uma dependência exagerada, choros continuados, dificuldades muito específicas, não se ligariam no grupo ou até o atrapalhariam; essa fase tem um caráter provisório, de ajustamento e adaptação. Até a criança poder ser integrada num grupo. Faz-se necessário realizar estudos nos aspectos das dificuldades e das possibilidades da criança, com isso vamos buscando os caminhos a serem seguidos no seu trabalho, e não há dúvida de que a primeira condição para se realizar qualquer ajuda, é a aceitação da criança, a empatia, a descoberta pela criança de nossa cumplicidade e interesse em ajudá-la, baseado no que acreditamos da sua capacidade.

O TRABALHO DO PSICOPEDAGOGO NA CLÍNICA
O psicopedagogo clínico trata das dificuldades de aprendizagem, através de atendimentos em sessões realizadas individualmente ou em pequenos grupos, em consultório.
Para a avaliação, o psicopedagogo, no encontro inicial com seus familiares, na anamnese, usa dois recursos importantíssimos: o “olhar” e a “escuta” psicopedagógica, que o auxiliará a captar através de atividades lúdicas, desenhos, testes próprios da psicopedagogia, atividades avaliativas, do silêncio, das expressões do sujeito, dados que possa explicar a causa do não aprender.
Após essa etapa, surge à hipótese diagnóstica, os encaminhamentos necessários, o acompanhamento, dentre outros procedimentos inerentes ao trabalho terapêutico como orientação aos pais e professores e também contato com outros profissionais das áreas psicológica, neurológica, fonoaudiológica e outras, para que todos possam contribuir no tratamento. O psicopedagogo deve ser um mediador em todo processo, indo além da simples junção dos conhecimentos da psicologia e da pedagogia.
Para a utilização dos procedimentos diagnósticos e terapêuticos adequados, a prática psicopedagógica clínica deve está envolvida na concepção de um sujeito que aprende possuidor de características biológicas, cognitivas e socioculturais singulares, que o constituem enquanto um ser único, tendo, portanto um modo de aprender e ensinar, também peculiares. O atendimento clínico deverá obedecer criteriosamente todas as etapas investigativas e analíticas, com vistas à formulação de hipóteses consistentes no sentido de levantar hipóteses diagnósticas dos elemeninterferem no desenvolvimento do sujeito que aprende, sejam eles orgânicos ou inorgânicos.
Na psicopedagogia clínica os procedimentos diagnósticos e terapêuticos, obedecem à observação de aspectos importantes, dentre eles a análise de fatores orgânicos, motores, cognitivos, intelectuais, emocionais, sociais e pedagógicos, fortalecendo, sobretudo o rigor científico necessário à afirmação da Psicopedagogia enquanto Ciência voltada para o sujeito que aprende.
O psicopedagogo, através do diagnóstico clínico, irá identificar as causas dos problemas de aprendizagem. Para isto, ele usará de instrumentos próprios que irão subsidiar as suas hipóteses.
Após a hipótese diagnóstica inicia-se a intervenção.
Muitas alternativas para uso do psicopedagogo estão sendo colocadas no mercado. Muitos recursos apresentados por autores vêm beneficiando a avaliação e intervenção psicopedagógica. Resumi alguns deles:
1. Lendo e Escrevendo (1 e 2)
Este material pode ser aplicado para detectar se o estudante possui os requisitos básicos para o processo de Alfabetização. Pode ser usado em alunos da Pré- escola e séries iniciais. Autora: Geraldini P. Wintter e Melany S. Copit
2. Teste de Prontidão Horizontes. Pode ser usado para detectar Maturidade/ Prontidão para Alfabetização na pré-escola e séries iniciais do Ensino Fundamental. Autora: Neda Lian Branco Martins
3. Metropolitano de Prontidão - fator R. Pode ser usado para detectar prontidão alfabetização na pré-escola e séries iniciais do Ensino Fundamental. Autor: G.H. Heldreth, Ph.D. Griffiths Adaptação e Padronização: Ana Maria Poppovic

4. Becasse R-l (F e M) Este teste pode auxiliar no diagnóstico da maturidade escola. Ele traz atividades envolvendo: Estruturação de estórias; Títulos; conteúdos; Redação Omissão ou recusa; Dinâmica da Aplicação; Escolha da Lâmina. Autora: Bettina Katzenstein Schoenfeldt.
5. Papel de Carta. Este material pode ser utilizado para auxiliar na Avaliação das Dificuldades de Aprendizagem. Apresenta como conteúdo atividades envolvendo comunicação e vinculação. A Editora Vetor recomenda que este teste seja usado somente por psicólogos. Autora: Leila Sara José Chamat
6. Prontidão para Alfabetização. Trata-se de um Programa para o Desenvolvimento de Funções Específicas destinadas a alfabetização. Apresenta conteúdo teórico e prático. Autoras: Ana Maria Poppovic e Genny Golubi de Moraes. Além dos recursos apresentados pela editora Vetor, as provas piagetianas e os níveis de alfabetização são igualmente importantes podendo ser confeccionados pelo próprio profissional.
7. As Provas Piagetianas. Podem ser usadas para detectar o estágio do raciocínio lógico matemático da criança. O Conteúdo pode ser montado com o número de provas que se achar necessário. Ernesto Rosa Neto apresenta uma seqüência compostas por tarefas que envolvem a Classificação, Seriação, Classe- Inclusão; Conservação de Quantidades Contínuas e Quantidades Descontínuas.
8. Os Níveis de Escrita. Os Níveis de Escrita estudados por Emília Ferreiro, também são recursos excelentes. Eles podem ser utilizados para identificar o nível de escrita em que a criança se encontra no processo de alfabetização, podendo ser: icônico (a criança representa seu mundo através de desenhos); não icônico (a criança consegue usar letras para escrever e desenhar representando sua forma de escrita, porém o uso das letras não está sistematizado, muitas vezes coloca as letras e faz o desenho, usando ambos para escrever uma mesma palavra); realismo nominal (faz o uso das letras conforme o tamanho do objeto e não de acordo com a palavra, para ela o objeto grande deve ter muitas letras e o objeto pequeno poucas letras); nível pré-silábico (a criança já sabe que precisa de letras para escrever, embora não faça distinção entre letra e número, também já sabe que precisamos usar muitas letras diferentes para escrever). (Deste modo, a criança usa as letras do próprio nome variando a posição e a ordem em que elas aparecem no seu nome, para escrever novas palavras); nível pré-silábico em conflito (nesta fase a criança pode enfrentar um conflito já que conta as letras para escrever, mas no momento de escrever acha que é necessário muitas letras para escrever, acreditando que com poucas letras não é possível a escrita, ainda, ao pedir a ela que faça a relação de letras com sílabas, ela risca as letras que parecem sobrar. Isso pode acontecer com palavras monossílabas; ao vencer este conflito a criança entrará no nível pré-silábico); nível pré-silábico (a criança passa a atribuir valor sonoro a cada uma das letras que compõe a escrita e descobre que a escrita representa a fala). Deste modo, formula a sílaba - sem valor sonoro -, cada letra representa um valor som; nível pré-silábico "elaborado" (a criança percebe o valor silábico, portanto, usa uma letra para significar uma sílaba, assim usa uma letra para escrever a palavra monossílaba, mas como acredita que uma letras só não dá para ler, coloca outras só para que possa ler); nível silábico "alfabético" (começa a usar algumas sílabas, embora algumas outras usa só uma letra e se contenta com isso vai descobrindo a sílaba e começa a usá-la); nível alfabético (a criança já usa praticamente todas as sílabas simples, embora com alguns erros, sendo necessário trabalhar a ortografia).
9. Informática. Os recursos da informática, também, não podem ser ignorados pela Psicopedagogia. É verdade que o computador não possui flexibilidade para compreender outras linguagens, decifrar códigos desconhecidos ou criticar o que lhe é apresentado. Ele é mais um recurso que pode ser explorado de inúmeras maneiras. Considerando que a Psicopedagogia trabalha com a aprendizagem humana, os recursos da informática poderão possibilitar a criação, a comunicação, à interação, enfim novas descobertas promovendo a aprendizagem humana.

10- Cartilha da ABD . "Facilitando a Alfabetização – Multissensorial, Fônica e Articulatória", foi aprovada e reconhecida pelo Ministério da Educação. A cartilha atende aos profissionais da área de educação para reabilitação da alfabetização e suprir as principais dificuldades dos disléxicos, e vem acompanhada de um caderno multissensorial, que tem a função de estimular o visual, o auditivo, e o tátil sinestésico. Esse material se se encontra no site da Associação Brasileira de Dislexia.
11- Os livros da Renata Jardini também são excelentes para reabilitação da alfabetização e disléxicos. “Fundamentação Teórica e Distúrbios da Leitura e Escrita”. A proposta do livro é respaldar o educador ou clínico com as noções básicas dos principais distúrbios da leitura e escrita, como as dislexias, os Transtornos do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e outros. O “Caderno de Exercícios” vem com atividades para reabilitar os distúrbios da leitura e escrita.
Foram mencionados aqui, alguns instrumentos que podem ser usados para o diagnóstico e intervenção psicopedagógica, enfatizando que se o psicopedagogo não utilizar recursos exclusivos de outras áreas, não estará ferindo a ética profissional, ainda estará zelando pelo bom relacionamento com especialistas de outras áreas, conforme menciona o Código de Ética da Psicopedagogia, (Capítulo II, Das Responsabilidades dos Psicopedagogos, Artigo 6º, letra b), também, estará garantindo o bem estar das pessoas em atendimento profissional, conseqüentemente, mantendo a ética profissional.

No que tange ao levantamento realizado nesta pesquisa sobre alguns recursos para diagnóstico e intervenção psicopedagógica, destaca-se que não se trata de apresentar um kit de materiais para serem utilizados com todas as crianças e em todas as situações, pois tal atitude colocaria o psicopedagogo na posição de um simples aplicador de testes, não é isto que se quer para este profissional. Não é minha intenção também fornecer roteiros ou receitas para diagnóstico e intervenção.
O propósito aqui é refletir sobre os recursos que estão no mercado e utilizar da criatividade diante do que já existe. Portanto, cabe ao profissional analisar cada situação e decidir por aplicar o recurso que lhe for conveniente tendo em vista a qualidade de seu trabalho e o compromisso com o cliente.